terça-feira, 1 de abril de 2014

A Culpa é de Quem?


Esta coluna é especial porque foi desenvolvida em conjunto com Thiago Gonçalves, um “Butequeiro português” que entende da bagaça e desvendou alguns números nos borderôs dos jogos do Flamengo. Este post se tornou um complemento, um detalhamento de Porque o Ingresso é tão caro? Nos comentários deste post, o Butequeiro Ricardo Mattana, sugeriu ser interessante algum estudo para se determinar qual a relação “preço do ingresso x público”. Não se trata de um estudo exatamente, apenas uma observação.

Fazendo um pouco diferente, mas sem esquecer o que o amigo sugeriu, não conseguimos nos conformar com os públicos e rendas do Flamengo nessa temporada. É assustador o prejuízo nas partidas com clubes de menor porte, no Maracanã. O valor do ingresso é um problema, mas está muito longe de ser o único, tenho CERTEZA. A pergunta do post acima citado se refaz: Porque o ingresso é tão caro? Os clubes parecem, neste momento, de mãos atadas, principalmente o Flamengo. 

Analisando aos borderôs dos sete jogos que o Flamengo fez contra times pequenos no Maracanã em 2014, tiramos algumas conclusões. O Thiago analisou os borderôs das partidas contra Audax, Duque de Caxias, Madureira, Nova Iguaçu e Cabofriense pela Taça Guanabara e a 1ª partida da semifinal, novamente contra a Cabofriense. Estatisticamente, a amostragem é relativamente pequena para conclusões definitivas, apenas 6 jogos. Ainda assim, já é possível a observação, a comparação e a percepção do fracasso denominado “Cariocão Guaraviton 2014”, principalmente para os cofres do Flamengo e da FERJ (+ou-). Abaixo, uma tabela:

Um dos pontos de surpresa na análise foi a “precisão” do ticket médio, que ficaria dentro de uma “margem de erro” (diriam as pesquisas de opinião). Apesar da grande variância de público (de 2.073 pagantes contra o Madureira até 10.185 pagantes contra o Nova Iguaçu), o valor do ingresso médio pouco oscilou: 50,93 – 46,93 – 50,72 – 49,96 – 49,96 – 46,97. Como acreditamos em trabalho e pouco em coincidências, é provável que os Blues tenham definido que o ingresso médio ficaria próximo de R$ 50,00. Nisso contribuiu a distribuição de ingressos vendidos pelos setores do estádio, talvez baseados em valores do ano passado, a previsão vez com que em média  tenha sido atingida.  

Dois outros dados chamaram bastante a atenção: as meias-entradas e as gratuidades. Mesmo com um público pagante baixo, esta excrescência das leis cariocas somadas a imposição do consórcio em detrimento de uma administração conjunta dos clubes, transformam os mesmos em vítimas nesse processo. Os próprios ajudam ao consórcio a definir os valores dos ingressos, meio que forçados a aceitar altas somas para que não tenham deficit. Forçados também a se evitar o prejuízo técnico, mais até do que financeiro (não nos esqueçamos da estranha condução do “caso Engenhão”). O Flamengo em hipótese alguma jogaria em São Januário.

Observando a outras realidades, saindo um pouco do campo esportivo, nenhuma instituição em sã consciência aceitaria que em um espetáculo cultural onde 23% das pessoas entram de graça, sem que essas entradas sejam distribuições de cortesias comerciais (com ou por parceiros), e/ou até 47% do total das pessoas dentro dos espetáculos entrassem pagando a metade do valor de face. Achariam piada. E das boas. No Brasil, principalmente no Rio de Janeiro, ficou “fácil fazer cortesia com o chapéu alheio”, como diria minha mãe.

Para tentarmos entender o que se passa, a grande dificuldade sentida na leitura dos borderôs foi encontrar uma “lógica comum” para aplicar. Inexplicavelmente, alguns cálculos não seguem um rigor matemático como seria esperado. A conhecida e malfadada taxa de 10% da FERJ é inserida de formas diferentes em partidas diferentes. Ninguém sabe, é quase um mistério, saber se os 10% se dão sobre a renda bruta ou se depois de descontados os chamados “ingressos promocionais” (onde não ganhamos um centavo). Dá pra decidir e deixar claro, dona FERJ?

Pois é, além do absurdo de cobrar 10% da renda dos clubes, ainda distribuem "ingressos promocionais". Pior, em alguns jogos calculam estes ingressos, noutros casos, não calculam. Isso joga contra a transparência, que sempre exigimos do Flamengo e que Flamengo Vasco e Fluminense pediram na "cisão". Não há neste "documento" distribuído pela federação a “transparência” que um borderô sugere. Pior fica quando se constata a inclusão das taxas de transmissão de TV nos borderôs das partidas para “maquiar” prejuízos. Dos clubes. É óbvio. Confesso que foi a primeira vez que olhamos para uma série de borderôs com mais atenção e a lista de itens assusta. Abaixo uma listagem de despesas e deduções: 
  • O item “Aluguel do Estádio” não parece ter uma fórmula fixa, variando, provavelmente, de acordo com o público. No entanto, ronda sempre um valor muito próximo da metade dos lucros líquidos (sem contar ainda essa despesa), ou seja, Receitas – Despesas.

Reparem que só de despesas fixas, temos uma soma de R$50.129,98 + R$11,85 para cada ingresso vendido. São R$ 11,85 POR CADA TORCEDOR dentro do Maracanã. Essa lista esdrúxula que conta com a colaboração de governos, por meio dos impostos e também na IMPOSIÇÃO do consórcio, só reforça uma das minhas bandeiras aqui: O FLAMENGO PRECISA DE SUA CASA! SUA CASA! Não é possível ficar refém de aluguéis, custos fixos, associação dos Escoteiros, dos cronistas profissionais do RJ. Passa do absurdo! Surreal! Sei que com o pagamento das dívidas, só daria para começar a projetar um estádio em 2016 e construir em 2017. Quem sabe? Sonho com uma casa do Flamengo até 2020. Seria espetacular!

Estádio à parte, o Flamengo e o consórcio precisam vender melhor os espetáculos, promover aos eventos. Logicamente, a federação também deveria fazer sua parte e não tem feito. A promoção das partidas é ruim, e ainda há uma clara posição tomada pelos torcedores nesse campeonato estadual, de descontentamento com o produto oferecido (esse estadual é uma porcaria!). Se somarmos todos os clássicos disputados em 2014, a somatória não lotaria UM Maracanã velho. Talvez o novo.

Mesmo nesse panorama ruim, os “donos da casa” tem quase que a obrigação de especificar algumas coisas. Uma delas é a venda dos lugares dentro do estádio. A configuração atual do Maracanã, sua setorização, traz em minha visão, leiga em marketing, alguns problemas. Antes de tecer minha opinião, uma tabela com alguns números dos borderôs:

Grande parte dos torcedores do Flamengo assistiram as partidas atrás do gol, onde tradicionalmente se localizam as torcidas organizadas, onde ficam os ingressos mais baratos do estádio. Boa porcentagem se instalou atrás dos bancos de reservas, embaixo das cabines de transmissão, lugar também tradicional, hoje mais caro. A questão que levanto é: Como “vender” de modo simples o Maracanã e de que forma melhorar o aspecto visual, televisivo? É muito feio o estádio vazio para as câmeras de TV. É essa a que vendem para o mundo, mesmo com públicos superiores a 40 mil, inclusive.

Há um problema, grande parte do público se concentra atrás dos gol e também acima do setor que "aparece na TV", o setor Leste superior. Fica uma imagem ruim, de estádio vazio, mesmo que não seja verdade (não nos estaduais). Será que o ganho da setorização "inferior x superior" é tão grande? O que se ganha no momento é perdido em imagem, além das piadinhas na imprensa, o "onde está a maior torcida do mundo"? "Liberando" a passagem de torcedores Leste/Oeste superior para a parte inferior, como acontece no setor Norte, o estádio terá torcedores mais perto do gramado e ficará "visualmente mais cheio", uma imagem mais próxima da realidade para quem assiste de casa.

O mesmo problema ocorre nos jogos de Cruzeiro e Fluminense, onde por acordos contratuais, o “meio do campo” fica a cargo do consórcio e os clubes com os ingressos atrás dos gols. O Flamengo não teria esse problema. Estádio vazio é feio. Muito ruim para a imagem dos clubes no médio e no longo prazo. Mesmo que atualmente seja uma realidade, mas que não condiz nas grandes partidas. O Flamengo deve setorizar “melhor” o estádio, com atrativos que atualmente não existem.

Penso não ser da cultura brasileira a “setorização minuciosa” e menos ainda com valores tão diversos, principalmente em partidas de futebol. Quanto mais fácil for a identificação da “relação lugar/preço”, melhor para promover a venda. Um exemplo era a antiga setorização do “velho Maraca” em cadeiras verdes, amarelas e brancas na arquibancada, cadeiras azuis no anel inferior, cadeiras especiais e camarotes. Era mais simples na visão de quem fosse comprar.

Hoje, com um setor único e global, sem andares, compartimentado pelos Stewards (os “verdinhos” ou “laranjinhas”) e grades, fica mais difícil essa relação. Não que isso atrapalhe de fato, é apenas algo mais simples. Talvez esteja falando uma bobagem profunda. Particularmente, simplificaria e tentaria construir um novo setor VIP, para ganhar com um público que queira ainda mais conforto. Atualmente nos grandes jogos o Maracanã+ está “saturado”, sendo impossível um ST Raça ou Tradição, por exemplo, conseguir lugar. Acaba antes. Criaria o MARACANÃ+2, uma “opção VIP”, para quem gosta de assistir em pontos mais altos do estádio.

Sem a setorização e as denominações superior e inferior, dentro do estádio, seriam comercializados apenas três tipos de ingresso, somados às diferenciações de categoria na venda (Sócios Torcedores, Sócio torcedor que paga meia-entrada, entrada integral, estudantes, porcentagem para gratuidade e portadores de necessidades especiais). A nova setorização simplificada Norte/Sul, Leste/Oeste, Maracanã+ e Camarotes ficaria assim:

  • A venda dos camarotes se dá em processo alheio a venda dos ingressos para as partidas no estádio.
Os borderôs parecem demonstrar que o maior inimigo do Flamengo, tirando o consórcio e o passado do Flamengo é o próprio ST. Pela falta de fiscalização das carteirinhas de estudante (consórcio e Flamengo) e da própria lei que obriga o clube a dar desconto de “meia pra meia”, a meia entrada para o sócio torcedor. É nítido que nestes jogos o ST comum não é maioria em nenhuma das modalidades. Ou comparece ao Maracanã o torcedor que paga com meia-entrada, o que paga a entrada inteira (o maior “prejudicado) ou o ST-meia (grande beneficiado). LINK COM OS BORDERÔS NO GOOGLE DRIVE

Nos termos atuais e no cenário atual é quase impossível que o Flamengo ganhe dinheiro. Esses caras andam fazendo milagre. Calculando com a “tabela do Prejú” (a tabela das taxas, impostos e descontos), para abrir o Maracanã é necessário R$105.000,00 aproximadamente, sem contar com iluminação e taxa de aluguel. Esse é o valor a ser pago pelo contrato vigente do Flamengo, com ZERO PAGANTE E ZERO PRESENTE (obrigado, Cabral). O menor valor que o Flamengo pode cobrar por ST ou qualquer outro torcedor para não tomar prejuízo é de R$ 25,00, mesmo assim colocando 11.000 pagantes no Maracanã (o lucro exato com 11.000 pagantes é de inacreditáveis R$760,00). 

Por todos os motivos descritos acima, fica difícil o clube implementar o tíquete de temporada, pois o lucro é mínimo. Mesmo assim, pensamos ser o único ou o mais provável fator de alavancagem, tanto do ST, quanto das receitas e do público dentro do estádio, já que pode se ganhar com o Matchday, estacionamento, bares e camarotes. No caso do basquete, no “Final Four” da Liga das Américas, por exemplo, não foi permitido a venda de ingressos em pacotes, pois a concessionária fez a operação dos ingressos, não o Flamengo. Mas isso é assunto para a próxima semana, onde segue a coluna a quatro mãos em parceria do Thiago Gonçalves, a quem agradeço pela gigantesca contribuição.