terça-feira, 18 de março de 2014

Porque o Ingresso é tão Caro?


A coluna de hoje é “simples”, um pedido do Mestre Melo. Não sei se vou responder exatamente o que ele pediu ou desejou, mas tentarei “refletir” sobre essa questão que nos aflige “diariamente”, os ingressos e os preços praticados nos jogos do Flamengo. O Pedido se fez nos comentários da coluna que escrevi na semana passada: 

“A pauta é simples. Tentar responder à pergunta: Por que o ingresso está tão caro? - Eu tô meio de saco cheio de ficar ouvindo “Flamengo elitizou isso, Flamengo encareceu aquilo etc etc etc”, quando vejo outros clubes colocarem ingressos a 60, 70, 80 reais, e olho o Flamengo, por exemplo, praticar o preço mais barato da Libertadores e o assunto ser ignorado.

O ingresso é caro porque existe um contexto para que isso ocorra. Acho que o Luiz pode perfeitamente tratar isso, talvez mencionando o que ocorreu em outros centros, historicamente avaliar se esse processo está estabilizado ou ainda em movimento (encarecimento ou barateamento), quais as vertentes (inglesa, alemã etc), e qual o quadro que se desenha no país.
Algo assim. Fica como sugestão rs”.

“Muy amigo”, hein? Que desafio! São muitos os fatores que tornam o ingresso caro e faz com que seu preço seja alto no futebol brasileiro. Mesmo contextualizando, vou tentar ao máximo focar no caso do Flamengo, lógico. O primeiro aspecto a se pensar nesse caso são algumas singularidades entre custo, preço e valor. Um pequeno e objetivo texto explica, facilitando meu caminho, veja:

“Para definir o preço de alguma coisa é preciso analisar o valor daquele produto ou serviço, do ponto de vista do possível comprador. Se a percepção dele registra valor irrelevante, o preço será necessariamente baixo. Portanto, se quisermos obter um preço melhor por aquele bem, será necessário procurar outro comprador ou encontrar meios de alterar a percepção de valor daquele cliente em relação ao que colocamos à venda. 

O valor, por sua vez, é a razão entre um número e uma percepção. Ele também depende de uma referência, neste caso, um pouco mais subjetiva. O valor é definido não só pelo que a organização faz (produz), mas pelo o que os clientes adquirem seus bens e serviços. O valor, então, não apenas assume diversas formas, mas se materializa por meio de diversas fontes: utilidade do produto, qualidade, imagem resultante da publicidade e promoção, disponibilidade (distribuição), etc.

Não é por acaso que os vendedores mais experientes nunca sugerem que algo tem preço baixo quando o objetivo é passar a mensagem de que o serviço oferecido tem qualidade. 

O custo x benefício ainda é a melhor forma de fazer um comparativo entre o preço e o valor do produto ou serviço. [...]Independente do produto ou serviço oferecido ao seu cliente, a eficiência do processo é o primeiro passo, ou seja, fazer as coisas certas sob a perspectiva do desempenho, da produção, da qualidade do produto; o segundo é ser eficaz no que agrega valor ao cliente, atendendo suas necessidades e expectativas". 


O maior dos problemas é que o Flamengo não tem "aplicado" a parte final do texto, que espero, tenha sido explicativo, facilitando a questão. Os valores não atendem as necessidades e as expectativas, então o custo-benefício dos jogos do clube são desfavoráveis, em sua maioria. Uma outra informação relevante é a prática dos altos preços de outros clubes, cidades, estados. Não há grande diferença entre os valores praticados pelo Flamengo ou o Cruzeiro, por exemplo. Ambos dependem de concessionárias que administram os estádios em seus jogos, em Mineirão ou Maracanã. 

Um texto direcionado para pequenos empresários expõe fatores a se pensar na construção do preço de algum produto. Com a Palavra o SEBRAE:

“Concorrência
Além do aspecto financeiro, a definição do preço de venda deve levar em conta o aspecto mercadológico. O preço deverá estar próximo do praticado pelos concorrentes diretos da mesma categoria de produto e de qualidade. Também devem ser considerados o nível de conhecimento de marca, o tempo de mercado, o volume de vendas já conquistado e a agressividade da concorrência. Se o preço praticado pelo mercado for menor que o encontrado a partir dos custos internos da empresa, o empresário deverá refazer os cálculos financeiros para avaliar a viabilidade de seu negócio.

Recomendações para a formação do preço de venda
- Ao definir o preço de venda, devem ser levadas em conta as particularidades do segmento de atuação;

- Não vale a pena entrar no jogo dos concorrentes predatórios, que não conseguem se diferenciar e derrubam os preços. É melhor investir em diferenciais;

- Vale investir em comunicação. Os clientes devem ser informados sobre os novos itens vendidos, que devem ser expostos de forma mais atraente, facilitando a aceitação dos consumidores;

- A linha de produtos deve ser mantida. A interrupção resulta em perda de credibilidade junto aos consumidores;”


No tocante a concorrência, no caso do futebol, ela se dá principalmente entre as competições, não diretamente a um clube rival, até porque nem todos participam da mesma competição (ingresso). O Flamengo em 2014 só concorre diretamente com o Vasco no Campeonato Carioca, por exemplo. É exatamente essa “particularidade” que utilizo do texto para pensar a realidade momentânea. A competição é diferente, porém o produto é o mesmo, o Flamengo. O diferencial atual se chama LIBERTADORES e é exata e estranhamente onde o Flamengo pratica seus melhores preços. Talvez por retaliação à FERJ ou a redução de prejuízo no estadual. Acho que as duas coisas.

O clube não pode "combater a ele mesmo", mas deve ser mais efetivo na comunicação com seu cliente. Essa talvez seja a grande falha do “Flamengo azul”. O Clube ainda não se faz entender para o grande público. Pontuarei alguns em tópicos alguns motivos para a majoração do ingresso:

- As reformas no Maracanã, em 1998-99, 2005-06 e a ultima de 2010-13, são um fator a qual considero importante para se pensar o aumento do custo. Anteriormente o administrador era o governo do Estado (Suderj), que tentava introduzir um “novo modo de se torcer”, retirando os torcedores que tradicionalmente torcem de pé, com cadeiras por todo o estádio.

- A Suderj tinha como principal receita o aluguel do estádio e as taxas subiram progressivamente, e por consequência disto, o custo para o clube;

- Para a copa do mundo de 2014, os clubes ganharam um “parceiro”, a concessionária do estádio, com seus alugueis, taxas e percentagens correspondentes;

- Alta dos preços do mercado de entretenimento, superior a taxa de Inflação do período. Isso se deve ao “fenômeno” das meias entradas e gratuidades, somadas a própria inflação. Ocorreu também em teatros, parques, cinemas, que tem por si fenômenos específicos de cada setor, como a “shoppinguização” dos cinemas, por exemplo (Rs! Não resisti);

- Ter que conviver com a Federação e tradições institucionalizadas como 10% da renda, escoteiros, sindicato dos cronistas esportivos (por isso fizeram bico e ficaram do lado da FERJ) e etc.;

- As dívidas dos clubes, as preexistentes e as que tem sido construídas no momento, como as novas dívidas do Botafogo que parou propositalmente de pagar seus tributos;

- A “precariedade” e má utilização dos programas de sócio-torcedor;

- Novos estádios com maior conforto e gama de serviços, que demandam custo maior para manutenção, tecnologia e instrumentos, entre outros. O que também não significa que estes serviços tem sido prestados de modo satisfatório;

São muitos os motivos, poderia enumerar outros, mas passemos. No caso especificamente do Flamengo em suas “casas principais” no Rio e em Brasília, as gratuidades e as meias entradas estudantis não tem sido controladas, não há fiscalização decente. Um problema sério. 

Avaliando outros centros melhor sucedidos, como Alemanha, Inglaterra, Estados Unidos (Sim! Lá o público é maior, inclusive no futebol), o mercado do entretenimento é muito mais desenvolvido e o futebol é parte desse mercado.

Aqui não é comum se pensar o futebol como cultura, espetáculo, mas se exige implicitamente. Os valores são altos porque o mercado é assim, regula, mas que mercado é esse? Com crises econômicas, geralmente o mercado cultural demora mais a sentir os efeitos do “mundo real”. Isso, talvez explique porque o futebol, o mercado de games, cinema, demoraram um pouco mais para sentir a crise global de 2008. Somente de 2012 para cá os sinais de crise são mais visíveis, inclusive no Brasil.

Penso que o mercado do esporte está mais ligado ao entretenimento (como escape do mundo real), do que com a “economia cotidiana”. Reitero, como escape, nunca como "ópio". Um grande clube europeu não faz contratações a esmo, com valores vultuosos, que eram vistos anteriormente com naturalidade. Tem sido mais difícil este tipo de negócio, e acredito que pela crise em si, não pelo amadurecimento do mercado futebol, mesmo na Europa.

Ainda não existe “Monneyball” no futebol, mas a bola entra menos por acaso, também, e não falo apenas daqui. Muitos avançaram e mesmo assim erram bastante. Real Madrid, Manchester United e Barcelona os mais ricos e bem aparelhados também erram em contratações, em produtividade e em retorno financeiro e esportivo. Exemplo de Kaká e Cristiano Ronaldo "ao mesmo tempo", com Ozil, Di Maria, Modric todos no mesmo Real, Ibrahimovic e Neymar, por motivos diferentes no Barça e David Moyes contratado por 5 anos em substituição a Alex Ferguson, afundando o Manchester.

Neste momento não consigo visualizar qual será o caminho adotado no Brasil, mas sinto que chegamos a um teto, com um novo paradigma relacionado aos valores recebidos, na administração em si. Sem trabalho específico, e individualmente, os clubes não conseguirão suplantar os valores nos próximos anos. Chegou o momento de pensar no todo. Os impostos terão que ser pagos, o que não impede uma lei que “alivie” aos clubes, um Proforte da vida.

Diretamente sobre o ingresso, algumas questões se impõem para uma “escassez progressiva” do torcedor. Poderia enumerar algumas, como a violência ou a sensação dela, horário dos jogos, a ineficácia do transporte público, condições em que os jogos são disputados, fórmulas e campeonatos de interesse baixo, a “elitização” e a “retirada” do “torcedor tradicional” com aspas. Um dos grandes problemas é a não setorização ou “fragmentação” de setores com ingressos populares (uma pequena percentagem, que seja) somado a uma promoção de competições e jogos incipiente, falha de comunicação.

Sem ficar em cima do muro, tenho certeza que o Flamengo não pode jogar para 5 mil pagantes. Para 400 pagantes, de jeito nenhum! Primeiro deve se encontrar um valor próximo do ideal para se lotar o estádio, depois majorar o preço do ingresso, nunca antes. Mesmo com todos os problemas, uma medida já ajudaria bastante na fidelização desse torcedor, um pedido de muitos, um carnê de competição. 

Brasileiro (por jogo, parcelável em 6x e desconto de 10% à vista)
ST paga R$ 40,00, R$ 25,00 estudante.
Comum paga R$ 60,00; R$ 30,00 meia.

São 19 jogos no Campeonato Brasileiro, garantiria ao carnê 10 partidas no Maracanã, e nelas o comprador do pacote poderia escolher a qual ir, caso o Flamengo jogue mais de 11 ou mais partidas no estádio (o que é bem provável). Garante-se uma renda mínima, um público mínimo, razoável e seria uma experiência para os próximos anos. E com esse aspecto, poderia-se majorar o valor o "dia do jogo", quem compra avulso, como feito na Libertadores.

Em relação a metade do valor ser maior do que a "real", é que a "fatia" determinada ao consórcio ficaria intocada, com o desconto presente apenas na parte do clube, não na cota da concessionária, para que fique bem claro. Como o Flamengo já faz no setor Maracanã+. Por isso, R$ 25,00 "como metade" de R$ 40,00 (40 = 10 + 30 => 1/2 = 25 = 10 + 15). 

Uma medida paliativa seria momentaneamente acabar com a setorização no preço. Todo o estádio ficaria a disposição do comprador do pacote, com o mesmo valor, desde que haja escolha anterior ao momento do jogo. Criaria também um novo setor “VIP”, tipo Maracanã+2, no setor Oeste ou Leste superior. 

Precisaria de um tempo maior para aprofundar ao assunto, muitos deles. Daria até para escrever um livro, alguns estão sendo escritos por outrem (imagino). No momento posso dizer que tentei. Não está do jeito que gostaria, mas o desafio foi legal. Agora está a cargo de vocês, no debate e nas sugestões. As ideias dos comentários ajudam a refletir e evoluir sobre o assunto. Aguardo.