“DOSIS SOLA FACIT VENENUM”
Saudações
flamengas a todos,

E quando
a instituição se nega a vencer?
Flamengo
e Palmeiras, dois dos elencos mais caros do futebol brasileiro (e,
portanto, em tese adversários DIRETOS pelo título ou vaga na
Libertadores), próximos na tabela de classificação, fariam aquele
que se convencionou denominar, pelo jargão convencional, “jogo de
seis pontos”. O Flamengo, com classificação melhor, detendo o
mando de campo e em ascensão anímica, decorrente de dois bons
resultados recentes, reunia uma série de elementos positivos,
capazes de transformar essa partida em um interessante marco inicial
para um salto rumo ao protagonismo ansiado há vários cachos de
anos.
Entretanto,
o time do Palmeiras, treinado por um dos profissionais mais
respeitados e qualificados do país (ao menos em termos táticos),
composto por alguns jogadores de qualidade técnica interessante, com
uma equipe trabalhada há algum tempo, e portanto um oponente
qualificado, seria um adversário duro, árduo, especialmente diante
de um Flamengo ainda buscando encontrar seu caminho, explorar o
potencial de um elenco ainda desajustado.
Era o
tipo de ocasião para o torcedor jogar junto.

Porque a
torcida deu a mão. E ajudou a inflamar o time. Que ganhou na marra.
Esse é o
ponto. O Flamengo erige-se gigantesco, vencedor, dotado de uma força
descomunal, quando traz sua torcida para o campo de jogo. Quando se
dão as mãos. Quando se cria o amálgama que o transfunde com sua
gente, formando uma e uma só entidade, um só espírito, que joga,
pulsa, ferve, briga. E vence. Não importa se no Maracanã, na Ilha
do Governador, na Gávea ou na Rua Paissandu.
Decerto,
esse fenômeno, que fez da torcida do Flamengo algo referencial,
deveria ser estimulado, à guisa de elemento intrínseco à grandeza
do clube, norteador inclusive de sua identidade.
Tornemos
ao domingo. Debrucemo-nos sobre o acontecido:
Flamengo
e Palmeiras, dois adversários diretos, enfrentaram-se no Estádio
Mané Garrincha, em Brasília-DF, num jogo que daria ao vencedor uma
das vagas no tal G4. Eis que o Flamengo, cuja equipe encontra-se,
pelas circunstâncias já mencionadas, em um patamar inferior, ABRE
MÃO de uma vantagem competitiva importante, ao CONCEDER a área
mista do estádio ao acesso de torcedores de qualquer clube. O
Palmeiras não atuava na cidade há muitos anos, o que evidentemente
criou um contexto de demanda reprimida, com potencial de captação
de vários torcedores do clube.
O
Flamengo SABIA desses detalhes. E não contente em aceder, ESTIMULOU
a enchente verde, pelo que se depreende das vozes de seus dirigentes
e pela prática já tornada recorrente em seu histórico recente,
mesmo em jogos no Maracanã.

O
Flamengo entrou em campo VAIADO, segundo relatos de cronistas que
cobriam a partida. Um time em formação, que precisava se afirmar,
começando a demonstrar sinais de espírito de luta (e, portanto,
capacidade de atrair o torcedor), que poderia ser pego no colo por
uma torcida ávida de vitórias, subiu no gramado sob APUPOS do
inimigo. Isso naquela que deveria ser sua casa.
O
desfecho foi previsível. Atuando inteiramente à vontade, o
adversário apenas em poucos momentos perdeu o controle do jogo, e
chegou a uma merecida e justa vitória. Naturalmente, não foi o
estádio rachado que decidiu o jogo para o lado verde. Mas a falta da
torcida flamenga certamente tirou da partida um elemento que poderia
ser um diferencial ao nosso favor.
Daí,
torno à pergunta do início do texto: O Flamengo quer vencer?

Donde,
futebol, hoje, NÃO é prioridade para o Flamengo. O clube NÃO quer
vencer. Não pensa em pagar o preço.
Então
entramos na principal competição nacional sem zagueiros, porque
tudo é muito caro. Estamos há DOIS anos sem uma alternativa
razoável para a falta do Maracanã/Engenhão porque o clube é
“perseguido” politicamente. Anunciamos uma reformulação
“profunda” no Departamento de Futebol e, decorridos VINTE dias da
humilhante eliminação da Copa do Brasil a única mudança é a
saída do treinador adoentado, cujo sucessor, após dois interinatos,
ainda é desconhecido. Perdemos quase UM MÊS para contratar o tal
Gerente de Campo, porque... sabe-se lá porque.
Tudo é a
questão da prioridade.
O célebre
cientista Paracelsus, lá nos idos do Século XVI, cunhou uma frase
lapidar: “O que diferencia o remédio do veneno é a dose.”


Em todas
essas histórias citadas, havia o genuíno senso de recuperação a
curto prazo, de retomada rápida da grandeza perdida.
Não
vemos demonstração dessa sede, dessa ânsia, nos tempos atuais.

Enquanto
isso, o Flamengo abre as portas, estende tapete, arreganha cadeiras e
mais cadeiras para os visitantes, toca hino, tira foto, enfim, cria
um lindo, edificante e romântico ambiente destinado a fazer dos
jogos em SUA CASA uma experiência inesquecível para o torcedor e o
jogador paulista. Naturalmente, o time apanha, o torcedor apanha, a
instituição apanha. Apanha dentro de campo, fora dele e no
tribunal. Mas o que importa é que a meta de arrecadação foi
alcançada e o clube foi elogiado na tevê, olha que legal. Somos
pioneiros.
Talvez
seja o caso de, doravante, propor mandar o jogo contra o Corinthians
no Itaquerão. Lá lota e dá dinheiro. A torcida deles enche o
estádio e a gente fica com a renda. Vanguarda.

É feio.
O Flamengo “não pode ter práticas ruins só porque outros
praticam”.
Talvez
ganhar jogos e campeonatos, então, seja uma prática ruim.
Encerra-se
aqui somente com uma ponderação: houve uma eleição. Dois grupos,
de mesma origem e pensamento semelhante, digladiaram-se com uma
mensagem, no fundo, bem parecida. Falou-se ostensivamente em
“recuperar o futebol”, “dar atenção ao futebol”, “futebol
vai ser prioridade”.
Futebol,
senhores, não deve ser concessão de “prioridade” do Flamengo.
Futebol é sua ALMA.
Entendam
isso, ou perecerão.
Boa
semana a todos,