segunda-feira, 11 de março de 2013

O Treinador e a Engrenagem

Buongiorno, Buteco! Vem aí a Taça Rio e a pressão natural pra conquistá-la. O Flamengo é um time vencedor. Ponto. Quando o Flamengo não ganha, se a crise não ameaça se instalar, ao menos fica algo estranho pairando no ar, e talvez essa característica no clube não seja tão ruim assim. Afinal, acostumar a perder não combina com Flamengo. Outros clubes podem achar normal ser vice ou mesmo não conquistar títulos em uma temporada; não o Flamengo. Entretanto, o momento que vive o Flamengo não é dos mais simples. Se é verdade que, dentro do Departamento de Futebol, o clube vive dias de normalidade, organização e disciplina não experimentado em décadas, por outro lado, apesar de a atual Diretoria dar todos os sinais de que tem planejamento e sabe o rumo a tomar, são as decisões que tomarão e as escolhas feitas nesse processo que determinarão se o clube trilhará o caminho escolhido ou destoará do plano.

Uma das discussões interessantes que travamos nos últimos dias no Buteco ocorreu em torno do treinador. Dorival conduziu o Flamengo por um período de invencibilidade que durou meses, mas a derrota veio exatamente quando não poderia ocorrer, no primeiro confronto decisivo. Particularmente, seu trabalho mais me agrada do que desagrada. Está longe do padrão tático que vejo na Europa, porém são pouquíssimos os treinadores brasileiros que, como ele, atrevem-se a tentar implementar algo remotamente parecido com o que se joga no primeiro mundo do futebol hoje em dia, e nenhum deles, ao meu ver, está no nível do padrão europeu. Portanto, agrada-me ter um treinador com esse perfil, principalmente porque, em entrevistas, demonstra estar sintonizado com o que ocorre na Europa e tem uma visão crítica e realista em relação à crise tática e técnica pela qual passa o futebol brasileiro, a qual, porém, é negada e mascarada pela mídia ufanista brasileira.

Desagrada-me em Dorival Júnior sua falta de iniciativa em encontrar soluções para os problemas defensivos do seu esquema tático e a própria inércia na busca de alternativas para o time não jogar apenas no contra-ataque; a sua incapacidade de lidar com os medalhões do elenco do Flamengo e a recusa de buscar novas alternativas que não esses jogadores. Preocupa-me sua insegurança, demonstrada ao trocar o esquema tático no qual havia apostado, de forma vencedora, durante todo o primeiro turno na primeira dificuldade que encontrou pela frente - o adversário na frente do placar no intervalo da semifinal da Taça Guanabara - e a adoção de uma formação jamais treinada, focada na inexplicável aposta em jogadores que quase levaram o time à Série B ano passado. Confesso que tenho dúvidas se, apesar de todas as qualidades que ressaltei, é um treinador vencedor, nascido para vencer, que tem a frieza e a gana daqueles que são conquistadores e "papa-títulos".

Pelo que vi até aqui, Dorival precisa de um complemento, talvez um diretor que se responsabilize pela parte disciplinar e deixe-o à vontade para cuidar da parte técnica e tática, além das contratações. Pelaipe pode inclusive ser a pessoa com perfil ideal para trabalhar com o nosso treinador. É exatamente nesse ponto que a Diretoria precisa refletir bastante para tomar qualquer decisão.

Vejo tudo como uma grande engrenagem. Hoje, acho que, fora de campo, o Departamento de Futebol está até razoavelmente equacionado. Dentro das quatro linhas, acho que o time tem jogadores mais experientes que, contudo, não se mostram à altura do que deles se espera. Juntos, não valem um Seedorf, para ser mais exato. Coragem para  enxergar esse fato e a incapacidade desses atletas de conduzir os jovens ao caminho dos títulos seria de enorme importância, primeiramente, porque o dinheiro é curto e é cada vez mais essencial ser exigente na relação custo/benefício, principalmente em momentos de crise financeira; em segundo lugar, porque, repetindo, no Flamengo a pressão sempre existirá e é normal que assim seja.

Por outro lado, no cenário atual, se não for para contratar um grande treinador estrangeiro e caso Dorival não se torne excessivamente caro por uma suposta cláusula em seu contrato, talvez seja melhor ficar com o atual treinador e trocar algumas peças do elenco do que o contrário, já que poucas são, no Brasil, as alternativas para um Flamengo "minimamente em sintonia" com um futebol moderno, ofensivo e competitivo, ou seja, com o que de melhor se joga no primeiro mundo desse esporte: uma seria a terceira passagem pelo clube do inconstante e problemático Cuca; a outra, Mano Menezes, um Dorival com banco de couro, trio elétrico, ar e direção hidráulica, acessórios que podem ser agregados ao nosso treinador com o tempo. E só. Fora disso, seriam os congêneres de Muricy Ramalho, Felipão, Abel Braga, etc. e o retorno aos esquemas repletos de volantes, faltas, antijogo e tudo o que tornou o futebol brasileiro obsoleto tática e tecnicamente nos dias de hoje. 

Dorival ainda não está balançando, mas não custa ajudá-lo, até porque, com o material que ele possui no momento, e com sua propensão a insistir com os medalhões, o quadro que se desenha no horizonte é de dificuldades e não muito alentador.

Uma decisão puxa a outra. Certa vez o meu amigo Patrick Selener, num bate-papo a respeito de reforços, há anos atrás, disse-me algo do que não me esqueço: que contrataria baseando-se no currículo. Observaria os títulos do jogador, o que ele conquistou, como uma das referências principais para tomar a decisão. Óbvio que para determinadas contratações essa premissa não serve, em especial as chamadas "apostas", mas para os jogadores mais importantes, e em especial aqueles que servirão de referência para o elenco, em torno dos quais o time deve ser montado em busca dos títulos, acredito que seja um parâmetro sábio e preciso.

O Flamengo precisa, urgentemente, de novas referências dentro de campo; mais do que de outro treinador. A geração mais vencedora do clube foi formada em torno dos jogadores certos. Tudo bem que o técnico era excepcional, mas a referência para a formação dos jovens vinha de jogadores como Raul e Paulo César Carpeggiani. Outro nível.

E você, amigo do Buteco? O que pensa a respeito?

Bom dia e SRN a todos.