sexta-feira, 1 de junho de 2012

Turva e Borrada

Minha intenção era escrever a coluna de hoje sobre a proposta da Adidas e como um dos aspectos a serem considerados para avaliá-la deveria ser o gerenciamento e o planejamento das ações referentes a imagem do clube, o tal do branding. Mas com todos os acontecimentos bombásticos de ontem, não teria como mudar completamente o tema das discussões que certamente vão continuar como foco principal do clube, pelo menos até o jogo de 4a feira pelo Campeonato Brasileiro.

Acontece que todos esses acontecimentos acabam se relacionando em um ponto chave, que é justamente o que eu pensava em abordar para a coluna de hoje: a imagem do Flamengo. Vamos por partes. Textos foram publicados em diversos blogs esportivos sobre a proposta que a Adidas fez para patrocinar o Flamengo. Foram seguidos por outros tantos comparando os prós e contras da proposta no que diz respeito não apenas a valores, mas também a ações de parceria, distribuição, qualidade do material, etc. Mas em momento nenhum, isso foi colocado do ponto de vista de estratégia do clube. O principal motivo é que o clube não tem ou não parece ter um planejamento de imagem para curto, médio, longo ou nenhum prazo. Na verdade, pouquíssimos clubes brasileiros tem.

A estratégia de imagem é o planejamento que uma entidade faz de como ela deseja ser vista pelo público e de que forma ela deve agir e se manifestar para atingir esse objetivo. Ora o dia de ontem foi riquíssimo em exemplos de que o Flamengo não tem nenhum tipo de gerenciamento de imagem. O clube não conhece seu público consumidor, é um contumaz rompedor de contratos e parcerias além de não ter nem mesmo um direcionamento de marca decente, se associando a qualquer empresa que pagar o valor pedido, o que ficou demonstrado na votação do patrocínio que seria de uma churrascaria e acabou com uma empresa de logística de um dos conselheiros. Eu não me espantaria se ao lado da marca do Unicef, o flamengo tivesse uma fabricante de armas na camisa, se tal empresa se dispusesse a pagar os tais 30 milhoes pedidos. E é aí que eu quero chegar.

Ainda que haja uma significativa diferença de valores, entre o que a Olimpykus paga e a nova proposta, existe uma questão de foco nas propostas. A adidas não ofereceu essa grana toda para vender camisas do Flamengo em Berlin. Na real, hoje o Flamengo não é muito mais do que o clube onde Ronaldinho jogava e com quem teve um desentendimento ou um clube que foi campeão do mundo há 30 anos. A Adidas quer um clube que é um dos maiores vendedores de camisa do mundo e que tem a esmagadora maior parte das suas vendas no Brasil. Sim, o nosso emergente mercado é o que quer a Adidas mas e o Flamengo? 

O Flamengo hoje tem uma fornecedora que leva as suas camisas a todos os cantos do Brasil. A Vulcabrás, dona da Olympikus tem uma rede de distribuição gigantesca espalhada pelo país e tem demonstrado ao longo da parceria atenção especial com o seu cliente principal: o torcedor rubro-negro. Por sua vez, a gigante alemã oferece ao Flamengo a oportunidade de voltar a ter sua camisa vendida em suas lojas ao redor do mundo, como ocorre hoje com Palmeiras e Fluminense. Uma oportunidade de crescimento de marca sensacional se o clube souber como aproveitar e eu tenho fé de que uma diretoria nova e competente será responsável por gerenciar esse processo. Mas fica pergunta, mais uma vez, agora um pouco mais clara: O que quer o Flamengo para seu futuro? Se firmar como o clube de maior torcida (e mercado consumidor) de uma das economias que mais cresce no mundo ou iniciar sua expansão para mercados internacionais?
 
A escolha dos parceiros de uma marca é muito importante para mostrar aos seus consumidores as qualidades e valores daquela empresa. No caso de um clube os parceiros devem representar os ideais, os valores centenários associados aquela camisa, no caso do Flamengo seu apelo popular e democrático, a raça e a qualidade do futebol. Esses valores devem estar presentes em todas as ações do clube e serem praticados por todos aqueles que o representam, da presidência aos funcionários. A contratação de jogadores e técnicos também deve ser norteada e conduzida da mesma maneira assim como a formação de atletas.
 
Eu pensava sobre isso quando assisti ao video do nosso (ex?)VP de futebol, inocentemente filmado em uma conversa informal com torcedores falando sobre assuntos internos do Flamengo. E voltei a pensar sobre isso quando saiu a notícia da saída do Ronaldinho e a imediata repercussão nos jornais pelo mundo. Me questionei sobre o investimento necessário para uma expansão da marca do clube para novos mercados como a China. Considerando que o clube se expõe dessa forma, que empresa ou patrocinador gostaria de investir no Flamengo? E me lembrei de outros episódios como o video de ronaldinho se masturbando na internet, o caso Bruno, o episódio com Adriano e sua ex-noiva e por aí vai. Lembrando que estamos falando de um negócio com orçamento anual de 200 milhões de reais.
 
A gestão atual parece ter levado a incapacidade de gerenciamento de imagem a níveis inimagináveis mas certamente não é pioneira no assunto. O Flamengo já foi refém de Romário, Adriano, da briga entre Edilson e Pet que quase nos levou a um rebaixamento e já houve casos antes, estou me atendo apenas aos mais recentes. Da mesma forma, sempre que o clube chega a decisões ou jogos de grande apelo vemos a torcida sendo mal-tratada na tentativa de comprar um simples ingresso, assim como as invariáveis cenas de violência, cambistas, etc. E também já passamos pelo ridículo de ver os jogadores se cobrindo com toalhas no inverno de Caxias do Sul porque a então fornecedora de material esportivo, em litígio com o clube, não enviou os uniformes de jogo de mangas compridas e nem agasalhos. É um longo histórico, que parece não ter fim.
 
Como todo torcedor rubro-negro, orgulhoso do que o Flamengo já foi um dia, é claro que eu gostaria de ver a camisa do Flamengo sendo colocada ao lado das dos gigantes europeus. Mas quero vê-la exposta como uma igual, respeitada pelo seu significado e pelo tamanho da nossa Nação, não como uma curiosidade que somente algum colecionador de camisas qualquer vai querer comprar. Pessoalmente, gostaria muito de ter a oportunidade de ver uma camisa retrô da Adidas para comemorar os aniversários do nosso mundial, além de considerar a qualidade de suas camisas muito superior as da nossa fornecedora atual. Só que esses são motivos que pesam para um torcedor, movido pela paixão e por seus gostos pessoais. Um dirigente de um clube do porte do Flamengo deve levar diversos outros fatores em consideração antes de firmar um novo contrato, seja ele com um caríssimo e problemático jogador, que pode comprometer a imagem do clube, ou com uma empresa que vai fornecer seu material esportivo. Ou pelo menos deveria ser assim.

abs e SRN!