domingo, 4 de março de 2012

Na beira do campo



Na última coluna abordei a maneira como a organização do departamento de futebol pode influenciar os resultados do time e como cada papel é importante na cadeia de comando. Hoje vou falar do ponto mais abaixo dessa hierarquia que, ironicamente, acaba sendo sempre o responsável direto pelo desempenho do time neste nosso futebol brasileiro dito profissional: o treinador.

Essa semana, estava conversando com o pessoal do escritório onde trabalho sobre o amistoso da Seleção e o trabalho do Mano Menezes. Chegamos a conclusão - que eu já vi ser discutida diversas vezes aqui no Buteco - que vivemos no Brasil uma séria deficiência não apenas de bons jogadores, mas também de treinadores. A nossa seleção apresenta erros muito semelhantes aos que comentamos aqui falando do Flamengo, por exemplo. Perguntei essa semana ao nosso colunista Gustavo quem teria sido o último grande técnico do Mengo e me fiz a mesma pergunta sobre o escrete canarinho. Talvez o próprio Luxa no Fla em 95 e o Telê no longínquo 86. Me lembrei inclusive que o capitão Claudio Coutinho acumulou durante algum tempo os dois cargos de técnico com maior pressão no país: técnico do Flamengo e da Seleção Brasileira. E Pensando nos últimos treinadores que tivemos no Rubro-Negro fiz uma breve pesquisa na internet e encontrei uma lista extensa e com nomes incríveis. Vale a pena observar que, com poucas exceções como Muricy, Tite e Felipão, a maioria dos "técnicos de ponta" do mercado nacional já comandou o Flamengo.


Mesmo contando com a inestimável ajuda de São Judas Tadeu e da Divina Providência que tiraram Williams, Airton e Renato do jogo deste domingo, creio que o velho Joel não terá uma passagem duradoura no Flamengo dessa vez. Para mim será um alívio porque se o time do Luxemburgo era ruim de ver jogar, esse do Joel é terrível. O chato é que isso deve nos custar a Libertadores e todo o primeiro semestre. E aí eu pergunto quem deveria ser o técnico do Flamengo para que ele volte a jogar como Flamengo?

Como de costume, quando se trata de Flamengo, nada é tão simples quanto deveria ou poderia ser. Primeiro é necessário definir o que queremos dizer com jogar como Flamengo. Na minha concepção, o jogo do time deve refletir os valores Rubro-Negros: ousadia, coragem, raça e determinação. Em segundo lugar, precisamos definir o tipo de profissional que seja capaz de montar um time com essas características dentro do momento instável e caótico que vive o clube. Assim, o cara que vai treinar o time atual do Flamengo tem que reunir algumas características como: ousadia para armar um time sempre ofensivo, ter o estilo boleiro para ser capaz de lidar com as prima-donnas da casa e saber fazer a transição dos novos valores da base para o time de cima pensando em ter um time forte agora e um ainda mais forte num futuro próximo.

Como resposta a essa demanda, três nomes me passam pela cabeça e nenhum deles preenche 100% todas as qualidades necessárias. Seriam Abel, Dorival Jr e Renato Gaúcho. Vejamos caso a caso:

Abel é boleiro, tem títulos importantes na carreira e fez um bom trabalho no Flamengo com um time fraco que tinha como destaque o Felipe, que foi adiantado para jogar como meia-atacante em uma das melhores fases da sua carreira. Abel foi covarde e cometeu um erro em 2004 na decisão da Copa do Brasil contra o S.André mas se recuperou na passagem pelo Inter-RS com a conquista do Mundial. Vem fazendo um bom trabalho desde o ano passado administrando um time cheio de estrelas, com alguns jogadores medíocres e trazendo alguns valores da base. Abel seria a minha primeira opção se estivesse disponível.

Dorival fez um grande trabalho no Santos pós-Luxemburgo montando um time que encheu o Brasil de esperanças para o renascimento do futebol genuinamente brasileiro, jogado pra frente com ousadia. Mas bateu de frente com um Neymar moleque (que parece estar muito melhor hoje) e foi fritado do peixe, o que mostra que não tem tanto traquejo para lidar com estrelas e com o deslumbramento de alguns garotos. Além disso, não ganhou nada além de um estadual em cuja final cometeu o mesmo erro do Abel contra o mesmo Santo André mas tinha Neymar e Ganso. Fez trabalho sem destaque no Galo (que é uma zona quase tão grande quanto o Fla) e
vem fazendo um trabalho bom no colorado com um time ofensivo. Na minha visão, Dorival é um técnico de futuro mas o Flamengo de hoje - mais do que nunca - não é para principiantes.

E por último Renato Gaúcho que talvez seja o menos bem-visto dos três. Apesar disso, seus trabalhos no Vasco (2005-07), no Grêmio (2010) e no Fluminense (2008) mostram que ele ainda tem o ímpeto ofensivo que era sua marca registrada como jogador. São times que cometem poucas faltas e é um cara boleiro, que sabe lidar com jogadores boêmios, afinal foi um dos maiores da sua geração nesse quesito. Tem o mesmo problema do Dorival de nunca ter conquistado nada relevante, não sendo ainda um técnico de ponta e de ter feito trabalhos fracos em tempos recentes como a terrível passagem pelo Atlético-PR. Pesa contra ele o fato de ter DOIS rebaixamentos como treinador, os mesmos Vasco e Fluminense, o que faz muita diferença para o Flamengo em ano eleitoral.

Não é uma questão simles, mesmo sabendo o que se quer para o time. E ainda assim não existem garantias de que o time vai encaixar com esse ou aquele treinador. Mas realmente fica muito mais fácil de se cobrar resultados quando as metas são estabelecidas com clareza. E quando falo em resultados, quero deixar claro que não é a colocação no campeonato que faz diferença. O principal resultado esperado deve ser sempre a qualidade do jogo praticado pelo time. Li essa semana a seguinte frase: "Esse time não joga apenas para ganhar. Deve jogar de forma bonita e ofensiva para agradar aos sócios e aqueles que pagaram ingresso." O autor da frase era presidente do Barcelona nos anos 60 ou 70.

Ah, e não sei quanto a vocês, mas eu fico me perguntando se o elenco de algum outro time profissional do mundo joga tantas peladas (me recuso a chamar pelada de rachão) quanto o Flamengo. Mais do que isso, é incrível como pelo menos uma vez por semana, sai uma matéria no Globo.com sobre quem venceu a pelada que foi disputada ao invés de algum treino tático ou de fundamentos. Deve ser por isso mesmo que o time do Flamengo não é muito mais organizado do que aqueles que jogam nos campos do aterro.


abs e SRN!