sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

Alfarrábios do Melo

Saudações flamengas a todos,

Essa semana o time principal do Flamengo voltou a campo, após um hiato de cerca de dois meses. E, após os 4-1 sobre a Portuguesa que suscitaram os cantos de “Real Madrid, sua hora vai chegar”, sobreveio o frustrante 0-0 contra o modesto Madureira, na quente noite de Cariacica.

Em que pese o ritmo bastante lento da equipe ser natural, dado o estágio inicial da temporada, onde a questão física é sempre relevante, o treinador e o elenco ainda estarem se conhecendo e, a rigor, o foco real esteja nos jogos decisivos da sequência que iniciará dia 28 próximo, penso ser interessante pontuar algumas questões observadas nessas duas e na partida de estreia, contra o Audax (este, com os jovens egressos da base), para discussão e observação.

O NÍVEL DA BASE

O primeiro aspecto que chama a atenção relaciona-se com o nível dos jogadores que estão compondo o “time alternativo” do Flamengo. Para isso, invoca-se as escalações utilizadas nas estreias de 2018 a 2021:

2018 (2-0 Volta Redonda): Gabriel Batista, Klebinho (Dantas), Thuler, Patrick, Ramón; Jonas, Ronaldo, Jean Lucas (Jajá), Pepê (Hugo Moura); Lucas Silva, Wendel (Vitor Gabriel);

2020 (0-0 Macaé): Gabriel Batista, Matheuzinho, M Dantas (Pepê), Rafael Santos, Ramón; Hugo Moura, Vinição, Yuri Cesar, Luiz Henrique; Lucas Silva (Rodrigo Muniz), Vitor Gabriel (Wendel);

2021 (1-0 Nova Iguaçu): Gabriel Batista, Matheuzinho, Noga, Natan, Ramón; João Gomes, Daniel Cabral (Max), Yuri Oliveira (Mateusão), Lázaro; Thiaguinho (Gabriel), Rodrigo Muniz;

Perceba-se que em cada escalação é possível encontrar uns quatro ou cinco jogadores que se mostraram capazes de, ao menos, participar de jogos no profissional, mesmo sem necessariamente reunir capacidade de figurar na equipe titular (ou mesmo reserva recorrente). Mas a mínima condição de, ao menos “tapar um buraco” existia.

Matheus Cunha, Wesley, Noga, Cleiton, Ramón; Igor Jesus, Victor Hugo (Everton Araujo), Matheus França (Lorran); Thiaguinho, Mateusão (André), Werton (Petterson);

Desse time que atuou contra o Audax, quantos jogadores reúnem condição de pertencer ao elenco do Flamengo? Ou de sequer serem úteis como solução contingencial?

A ATITUDE EM CAMPO

É bem verdade que a condição física não era das melhores, como já pontuado. Início de preparação, “perna presa”, coisas que se sabe que atrapalham. Não surpreende, por exemplo, outras equipes grandes brasileiras também estarem às voltas com resultados ruins. O que não tem nada a ver com evidências de certa indolência e preciosismo mostrados domingo passado e, especialmente, na quarta. Com efeito, só na primeira etapa contou-se quatro/cinco toquinhos desnecessários de letrinha ou calcanhar, um deles desferido pelo intrépido Leo Pereira que, não surpreendendo, redundou na mais clara chance de gol do adversário, em um contragolpe de escanteio.

Já se teorizou e ponderou sobre uma suposta má vontade do elenco nessas partidas muquiranas de Estadual que, de fato e a rigor, pouco ou nada agregam. Mas elas estão aí, e o Estadual é uma poderosa máquina de crises, capaz de produzir as mais incômodas tormentas. Então, convém levar minimamente a sério.

ATITUDE FORA DE CAMPO

Os três jogos do Flamengo no Estadual guardaram certa semelhança, no sentido de que o rubro-negro enfrentou adversários que praticaram um jogo ríspido, truculento e mesmo violento. Todos, sem exceção, sob a complacência de arbitragens, no mínimo, negligentes ou incompetentes para coibir o antijogo. O de Cariacica, aliás, não só deixou de impedir como estimulou a cera e o sebo do adversário, inventando motivos inusitados para chamar a paralisação do jogo.

Imaginava-se que arbitragens maliciosas ou inadequadas haviam ficado em um passado enevoado pelas brumas de um charuto que se apagou. Mas não parece ser o caso. Cumpre aos membros da Diretoria do Flamengo, tão alertas para defender pautas que lhes convêm, atuar no sentido de, ao menos, proteger seu patrimônio milionário. Porque não será nada bom imaginar perder algum jogador do milionário plantel campeão continental por ter sido abatido a patadas em algum confronto contra um sparring rural.

VITOR PEREIRA E O ELENCO

A despeito da visível irritação provocada pelas alterações promovidas pelo Genro da Nação, especialmente na noite de quarta, as explicações dadas pelo Quincas na coletiva soaram um tanto convincentes, por enquanto.

A cautela no uso de Pedro e Everton Ribeiro e a falta de opções para a lateral-esquerda (cadê a base?) acabaram fazendo com que soluções extravagantes fossem tentadas, como o uso de Marinho na lateral-esquerda e a tentativa com o inexplicável Mateusão.

Um parêntese. Mateusão é daqueles camaradas que apresentam severos problemas de relacionamento com a bola, que lhe é estranha, fria, até hostil. Isso não seria um entrave maior, haja vista que outros jogadores, também indiferentes aos encantos da pelota, lograram alguma projeção neste abrangente mundo da bola (Dario Dadá, Jardel, Souza Caveirão, entre tantos outros). Mas a dificuldade de posicionamento e a falta da fome e da tarimba de finalizador o colocam em um nível similar ao dos esquecíveis expoentes do comando do ataque flamengo de 2004 e 2005. Sim, nosso simpático Mateusão teria dificuldades em se fixar como titular em uma eventual disputa de posição com os inesquecíveis Negreiros, Josafá, Dill, Whelliton e Dimba. Donde, insistir com o rapaz será malhar em ferro frio.

Entende-se que o momento de testar e avaliar determinados nomes é, de fato, este. Mas que Vitor Pereira não abuse da prerrogativa. É desnecessário recordar que o excesso de testes e invenções foi um dos fatores que minaram a passagem do triste romântico Paulo Sousa. Que o Quincas da vez tenha isso em mente quando pousar os olhos em seu banco de reservas novamente.

GUILLERMO VARELA

Não pretendo engrossar as vozes que marretaram com força as atuações do limitado lateral uruguaio nas duas primeiras partidas do ano. Também é desnecessário repisar as evidentes dificuldades apresentadas pelo jogador nos movimentos ofensivos, com os quais demonstra nítida falta de familiaridade. Como defensivamente, nessas partidas, quase não houve teste, dado o baixíssimo nível dos adversários, fica a imagem dos inúmeros cruzamentos errados e dos irritantes corrupios laterais e para trás, interrompendo ataques promissores.

A questão, a meu ver, passa pelo fato de que, em contextos que demandarão uma postura mais agressiva e ofensiva da equipe, Varela é a peça errada. Jamais terá a condição de emular o papel de Rodinei ou de outros laterais ofensivos de equipes flamengas pretéritas. Para que seja útil, deverá ser escalado em outro contexto ou desenvolvendo outra função, bem mais conservadora. O que demandará a presença de um jogador mais agudo no meio ou no ataque, que seja capaz de ocupar esse corredor pelo lado direito. Esse jogador existe no elenco? Pouco provável (não, Marinho não me parece essa opção).

De qualquer forma, seria interessante Vitor Pereira pensar em utilizar o jogador de uma maneira mais adequada à sua forma de jogo (nem que isso signifique sacá-lo em detrimento de Matheuzinho, outro que não empolga). Do contrário, o risco de derretê-lo será real e palpável.

Porque, se a torcida do Flamengo é inigualável, ela também não perdoa aqueles com quem cisma.