sexta-feira, 10 de junho de 2022

Alfarrábios do Melo

Saudações flamengas a todos,

Marcelo Lomba, Leonardo Moura, Welinton, Ronaldo Angelim, Juan; Willians, Correa, Kleberson, Petkovic; Diego Maurício, Vinicius Pacheco – DT Rogério Lourenço

Paulo Victor, Luiz Antonio, Marlon, Marcos Gonzalez, Ramón; Airton, Renato Abreu, Ibson, Adryan; Deivid, Vagner Love – DT Joel Santana

As duas escalações expostas acima provavelmente já figuraram em alguma conta de rede social, “enaltecendo” pavorosos momentos vividos na história recente do CR Flamengo. Um período que costuma ser evocado para que nunca mais tenhamos a sombria possibilidade de viver experiências marcadas pelo amadorismo, pelo improviso, pela incapacidade e pela chacota alheia.

Pois.

Os mais atentos já devem ter identificado que as formações acima alinhadas se referem aos times-base utilizados no Primeiro Turno do Campeonato Brasileiro nas edições de, respectivamente, 2010 e 2012.

Em 2010, os comandados de Rogério Lourenço haviam colhido, após dez rodadas, o total de 16 pontos ganhos, perfazendo um aproveitamento de 53,33%, o que colocava o Flamengo, àquela altura, na 5ª colocação do certame.

Já em 2012, o decadente Joel Santana, em dez jogos, havia amealhado 15 pontos, equivalentes a 50% de desempenho, mantendo-se em 10º lugar na competição.

Os dois casos retratam números e desempenho, a essa altura, superiores aos do Flamengo de 2022, dirigido por Paulo Sousa.

A simbologia soa nítida.

Apesar da estridente defesa exercida em algumas contas de rede social, não raro com comentários jocosos e mesmo ofensivos aos que praticavam o exercício do contraditório, o trabalho de Paulo Sousa, decorridos seis meses de sua contratação, pode ser considerado o pior de um treinador do Flamengo desde a infeliz, inoportuna e inadequada repatriação de Paulo César Carpegiani, em 2018, cujo desfecho acabou derrubando a cúpula do Departamento de Futebol do clube à época.

Com um detalhe: Carpegiani, em sua curta e sofrível passagem pelo rubro-negro, ganhou uma Taça Guanabara.

Vamos fazer um exercício simples. Nesses seis meses, qual foi o momento em que o Flamengo de Paulo Sousa deixou no torcedor, ao fim de 90 minutos, a sensação de orgulho, de satisfação, de identificação com a essência rubro-negra? Ou, vá lá, ao menos a alegria por uma vitória conquistada, se não com um bom futebol, ao menos com a competitividade tão cara às nossas cores?

Tentarei ajudar.

Que tal os 3-1 no Engenhão sobre o Botafogo, que alinhou um time ainda mais fraco do que o que disputou a Série B ano passado, sob o comando de um estagiário tapa-buracos? Ou as vitórias no Maracanã, pela Libertadores, contra Talleres e Universidad Católica, equipes com evidentes limitações técnicas e táticas? Ou talvez a “heroica” vitória no Chile contra a mesma U Católica, num jogo em que o Flamengo passou sufoco por boa parte do tempo?

Haverão de me chamar de injusto, por não recordar os 3-1 sobre o São Paulo, partida que de fato apresentou alguns lampejos do que se imagina que esse time deva produzir. Ou os emocionantes 2-1 no Fla-Flu, arrancados graças à sobrenatural atuação de um goleiro que fez cinco ou seis defesas milagrosas (eu ouvi César contra o Cruzeiro-2013? Diego “Bracinho” contra o Santos-2015?).

Os apreciadores da tática pela tática me arguirão, inflamados, ter esquecido as “ótimas” atuações contra Palmeiras e Atlético-MG, jogos em que a equipe apresentou “intensidade”, “fluidez das linhas”, “movimentos coordenados de ataque ao espaço multidimensional”, “abundante oferta de linhas de passe” e blá, blá, blá.

De fato, foram ocasiões em que o time até jogou bem. Mas não ganhou.

Enfim, penso ser pouco produtivo ficar aqui esmerilhando fatos sobre a medíocre atuação de um treinador que, se fosse brasileiro, teria caído ao final do Estadual. Um trabalho que jamais se desvencilhou de sua índole perdedora e irmanada com o revés e o fracasso. Uma passagem que nos deu a infeliz oportunidade de conhecer Paulo “Victor Hugo” Grilo e seu estranho e quase doentio deslumbramento por um goleiro que há dois anos demonstra evidentes limitações psicológicas e técnicas, não reunindo condição de sequer pertencer ao plantel do Flamengo.

Ainda assim, como se dizia antigamente, a culpa não é do Paulo Sousa. A culpa é de quem colocou ele lá.

Essa Diretoria do Flamengo teve duas oportunidades de escolher treinadores com calma, sem afogadilho, dentre um bom número de opções que lhes foi colocada no mercado, atendendo à prerrogativa de serem estrangeiros.

Nos dois casos, optou-se por alternativas econômicas. Se no primeiro caso a escolha por um estagiário que vestia a griffe “Guardiola” até se justificava pelo contexto da época, o que aconteceu em dezembro passado, que sucedeu um deprimente espetáculo de exibicionismo e despreparo, seguiu rigorosamente os mesmos ditames de economicidade tacanha, mesquinha e medíocre que tem pontuado as ações dessa Diretoria desde fevereiro de 2020, data em que foi trocado o Vice-Presidente de Finanças do clube.

Sim, em dezembro havia um cacho de opções interessantes, seja por currículo, seja por mentalidade, seja por abertura ao mercado brasileiro. Todas descartadas, sob justificativas plantadas na imprensa ou nas redes sociais. “Caro”, “não tem interesse em vir ao Brasil”, “retranqueiro”, entre outras do mesmo naipe, que ironicamente foram sendo sistematicamente desmentidas ao longo dos meses. Basta perceber quem está treinando alguns clubes de orçamento inferior ao do Flamengo. Clubes, não por acaso, acima do Flamengo na tabela.

Veio o mais barato. Com a griffe de “treinador de Copa do Mundo”. Ou de ter conseguido produzir vídeos de 2, 3 minutos, com o “lindo toque de bola” da Fiorentina, apontado como seu grande trabalho, que lhe conferiu a quinta ou sexta colocação no Campeonato Italiano de alguns anos atrás.

Nutro a férrea convicção de que rigorosamente nenhum dos que hoje detêm a prerrogativa de decidir os destinos do Departamento de Futebol do Flamengo reúne a mais remota noção do que é o “jogo posicional”. Estou longe de ser um especialista na área (mas não trabalho para o Flamengo, de forma que isso me torna inofensivo), mas penso que é uma filosofia de difícil assimilação e execução, que demanda tempo e, principalmente, paciência para florescer. Características que soam incompatíveis com as necessidades de um clube como o Flamengo, e tornam incompreensível o fato de, dos quatro últimos treinadores, três (Domenèc Torrent, Rogério Ceni, este mais maleável, e Paulo Sousa) serem adeptos desta filosofia.

“É um jogo ofensivo que o Barcelona pratica” – não creio que o conhecimento da Diretoria seja mais profundo do que essa inocente assertiva.

A opção pelo “barato, barato e barato” dessa Diretoria transcende a busca por treinadores de terceira ou quarta linha. Ela se espraia por todo o clube, seja na relutância em prover o Maracanã, mando de jogo em que assumiu a prerrogativa de administrar, de um gramado minimamente decente (o que trouxe consequências graves, como lesões e resultados ruins), seja na volta a uma política de contenção de gastos na contratação de reforços, recorrendo-se à fórmula de trazer, por empréstimo, jogadores encostados em outros centros tentando recuperá-los aqui, seja na inacreditável e sistemática política de sucateamento dos quadros do Departamento de Futebol, entregue a profissionais que ostentam currículos rabiscados em papel de pão.

Em paralelo à sanha de empreender esforços hercúleos para economizar moedas, alinha-se uma mentalidade paternalista, boleira, anacrônica, fundada na convicção de que o “craque resolve” (quem não se recorda das loas aos privilégios dados a Adriano?) e no empirismo. E, pior, na adoção de critérios bastante questionáveis para a formação de sua equipe (se o papel de pão for “parça”, tá dentro) e do elenco, onde a oferta de jogadores a contratar normalmente provém de um “personal-empresário”. Uma mentalidade que, ao delegar o protagonismo aos jogadores, estimula o surgimento de “prima-donas” mimadas e que se arrogam o direito de exercer o poder decisório na continuidade do trabalho de comissões técnicas, questionando escalações, barrações, folgas e quetais. Que eleva jogadores a “sócios”, com renovações perpétuas e fundadas apenas no reconhecimento de feitos passados. Só que poster não ganha taça.

Fico por aqui, apenas recordando aos que porventura acharem essas linhas ingratas com a Diretoria de 2019 que, no futebol, o bestial de ontem é a besta de hoje. Que o diga o Presidente do Flamengo Campeão Universal de 1981-1982, que saiu enxotado pela porta dos fundos da Gávea apenas UM ANO E MEIO depois de se sagrar Campeão Mundial.

Faltam 33 pontos.

Boa semana a todos.