domingo, 11 de outubro de 2020

Fechado (s) com Domènec



 Salve, Buteco! Quem me conhece pessoalmente costuma me chamar de sistemático. Gosto muito de planejar e me organizar, e talvez por isso um dos grandes desafios da vida, para mim, tem sido justamente entender a imprevisibilidade e a álea dos fatos cotidianos, além de compreender e conviver com quem não tem a menor preocupação com organização e planejamento. Contudo, como Aristóteles há muito tempo disse, in medio stat virtus, o que em bom português significa "a virtude está no meio". Se é verdade que a meia idade vem me ensinando a temperar o meu "jeito sistemático de ser", abandonar a organização e o planejamento seria migrar para o extremo oposto. Logo, é fácil perceber que, se não dá pra prever o futuro, é perfeitamente possível identificar, dentro de infinitas variáveis, cenários que com maiores chances de se formar. No plano do futebol, essa característica me transformou em uma espécie de "fanático do planejamento", não sei se obcecado, mas com certeza muito sensível a fatores como a montagem e o rodízio do elenco em função do calendário e do número de jogos e de competições a serem disputadas. Vocês provavelmente já devem ter notado, pela quantidade de posts e comentários que faço sobre esses assuntos. Em razão disso, preciso confessar, quando um fator como a saída de Jorge Jesus acontece e o time volta às principais competições sem a famosa "pré-temporada", eu passo a ser bem mais cauteloso na análise das performances do treinador, dos atletas, individualmente, e também do time, coletivamente. Minha essência sistemática coloca sérias barreias para concordar com críticas que não pesem bastante esse contexto. 

No caso de Domènec Torrent, então, é ainda pior: o treinador, que chegou faltando uma semana para o início do Campeonato Brasileiro, e cujo preparador físico chegou três dias antes da estreia, teve apenas duas semanas "vazias" para treinar o time: a primeira, justamente a que sucedeu a sua chegada ao Brasil, e a segunda, a que transcorreu entre os jogos contra Botafogo e Santos, entre a 5ª e a 6ª rodadas. Esse cenário já seria suficiente para acionar todas os meus freios analítico-sistemáticos, porém o treinador ainda enfrentou um surto de COVID-19 no elenco e os desfalques decorrentes justamente na semana de volta da Libertadores, uma viagem ao Equador, foco notório da doença, para jogar na altitude, e, como se tudo isso já não fosse suficiente, a convocação de quatro peças essenciais do time para servir às Seleções Brasileira, Chilena e Uruguaia. 

A título de comparação, o argentino Jorge Sampaoli, adepto do jogo posicional (o que é convenientemente omitido pela crônica esportiva), assumiu o Atlético/MG ainda em março, teve pré-temporada e, sem interrupções, começou a jogar antes do campeonato brasileiro, dando ritmo de jogo à equipe, que disputa apenas uma competição e tem um maior número de semanas para treinar, sem jogos intermediários. O argentino, por sinal, em sua passagem pelo Brasil, nada entregou enquanto disputou mais de uma competição com seus clubes. Seu melhor adveio justamente após as eliminações de Santos e Atlético/MG da Copas do Brasil e Sul-Americana. Em 2019, o português Jorge Jesus pegou um grupo quase idêntico ao atual durante a paralisação para a Copa América e teve a oportunidade de fazer uma pré-temporada, além de contar com quatro semanas livres para treinos (sem jogos intermediários) entre agosto (1) e setembro (3). Não se trata de comparar ou imaginar Domènec Torrent no mesmo patamar de dois treinadores tão experientes e com inegáveis currículos (Sampaoli, lembrem-se, já disputou duas Copas do Mundo), mas pura e simplesmente de contextualizar os acontecimentos.

Então vejam: quando, durante uma partida, eu escuto um comentarista como o Pedrinho dizer que o Flamengo está jogando estático por causa do jogo posicional e que nas etapas finais das partidas os jogadores abandonam o que o treinador diz e vencem a partida individualmente, já não é nem o meu perfil sistemático que me leva à revolta, mas os meus princípios e tudo o que entendo como relacionado a ética e caráter. Além da máscara do "comentarista diferenciado" haver caído, agora o que era apenas uma suspeita para mim se tornou uma grande certeza: Domènec Torrent é vítima de uma das perseguições mais covardes que já vi por parte do jornalismo esportivo brasileiro, especialmente da banda que é anti-Flamengo. A pauta (sim, o nome é esse) determina que, quando o time perde, é porque não se movimenta bem por ser estático, fruto do jogo posicional (desinformação sobre o conceito de jogo posicional); quando vence, os jogadores desobedeceram o treinador e decidiram sozinhos.

Com grande satisfação, apresento-lhes o rebelde elenco que não acredita e desobedece o treinador:



A decisão de cair nessa esparrela, minha cara amiga e meu caro amigo torcedor, é exclusivamente sua.

***

Os vídeos da comemoração dos jogadores no vestiário após a vitória de ontem, na minha opinião, expõem algumas verdades: primeira, que os jogadores têm pela instituição Vasco da Gama o reconhecimento de que é o maior rival do Flamengo; segunda, de que têm plena consciência do que significa vencer em São Januário e, terceira, de que estão unidos com o treinador tentando fazer o melhor para o Flamengo.

Em alguns grupos de WhatsApp do qual faço parte, a vitória de ontem, com um futebol aquém das possibilidades do grupo, foi comparada a algumas performances da campanha de 2019, como o 2x1 sobre o Fortaleza, o 1x0 sobre o CSA e o 1x0 Botafogo. Pela evidente presença do importantíssimo fator rivalidade, a comparação com a vitória sobre o Botafogo me parece ser a referência mais adequada.

Amanhã falarei sobre os desafios da semana.

Bom domingo e SRN a tod@s.