segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Olhando o Presente, Mirando o Futuro

Salve, Buteco! No último sábado, em Curitiba, o Flamengo conquistou sua primeira vitória depois da saída de Jorge Jesus do clube. Não foi uma atuação brilhante, mas o time ao menos demonstrou foco e vontade de vencer durante os noventa minutos. No domingo retrasado, contra o Atlético/MG, havia feito, no meu entender, aceitáveis quarenta e cinco minutos iniciais, mas pareceu ter morrido no segundo tempo. Por mais que tenham sentido as críticas feitas a Domènec Torrent pela tentativa de "inverter a pirâmide" com um time claramente sem fôlego para buscar o resultado, quando imagino as outras alternativas fico com a impressão de que teríamos chegado ao mesmo lugar. Afinal de contas, não é exatamente simples virar o placar contra um adversário que está em melhores condições físicas e mais ritmo de jogo.

Na última quarta-feira, na partida contra o Atlético/GO, achei procedentes as críticas à escalação de Rodrigo Caio na lateral direita, as quais acabaram sendo reforçadas pela aceitável atuação de João Lucas no último sábado; contudo, daí a atribuir o desastre dos 0x3 a "profundas mudanças táticas" promovidas pelo catalão vai uma enorme distância, ao menos na minha opinião. Observo que muitos jornalistas, desde repórteres que cobrem o clube a comentaristas, foram nessa onda. O excelente comentarista Paulo Vinícius Coelho, por exemplo, escreveu em seu blog que Domènec Torrent "fez algumas das coisas que produziram fúria nos tempos de Abel Braga", para mencionar formações como Gabigol aberto na ponta direita com Pedro centralizado e Bruno Henrique e Gabigol abertos nas pontas.

A questão é que Jorge Jesus cansou de utilizar essa e muitas outras formações durante as partidas. Arrisco dizer que nenhuma das opções feitas na quarta-feira, além da infeliz decisão de escalar Rodrigo Caio na ponta direita, produziu os 0x3 para o recém-promovido da Série B e então inativo há quase um semestre Atlético/GO. No último sábado, PVC talvez tenha dividido seu tempo entre os jogos do Grêmio e do Flamengo e perdido a parte em que a formação com Gabigol, aberto na ponta direita, permitiu a João Lucas cruzar a bola de maneira certeira para o cabeceio de Pedro, lance que o VAR anulou por milimétrico impedimento. Aliás, o próprio Gabigol se movimentou por todo o ataque, durante toda a partida, assim como o ataque se movimentou bastante no primeiro tempo da estreia. 

É curioso como pouco se fala que o time vem demonstrando menor capacidade de imprimir intensidade ao seu jogo, o que muito provavelmente é um problema de preparo físico e não tático. Foi o próprio treinador que reconheceu o fato em entrevista coletiva. Será que algumas de suas decisões táticas, no momento, não estão levando em consideração esse fator? É de simploriedade oportunista afirmarem que cada escalação, cada substituição do novo treinador é fruto de profundas mudanças táticas para implementação do famigerado jogo posicional. Parece que, no final das contas, tem muito profissional falando sem entender bem o que é jogo posicional e deixando de levar em consideração que ainda é cedo para tirar conclusões sobre como o novo treinador armará o time. Certas análises de cenário demandam tempo e não deveriam ser instantâneas como o preparo de um miojo. Talvez seja o caso do torcedor rubro-negro evitar cair nesse tipo de narrativa... 

Para mim, a pergunta que deve ser feita é: o que será que levou o Flamengo a ANDAR dentro de campo na quarta-feira? Não estou falando em menos intensidade, mas em postura, em ANDAR dentro de campo, o que não aconteceu na estreia e nem no sábado, mas apenas na quarta-feira. O problema não foi marcar em linha alta, Amigos, porque essa estratégia foi utilizada domingo, quarta e sábado e o time sofreu contra-ataques nos três jogos, como tomava na época de Jorge Jesus e como qualquer time que aplique essa estratégia também toma, no mundo todo. Marcação com linha alta está muito longe de ser uma exclusividade do tal "jogo de posição." A questão é saber por que o time foi apático em Goiânia. Só podemos especular e cada um pode ter a versão que melhor lhe convença... Cá com os meus botões, pergunto-me se a liberação para o jogo dos adversários que testaram positivo para COVID-19 não influenciou, o que, até o momento, neste campeonato, só aconteceu naquele jogo. Outro fator a ser considerado é que talvez o Flamengo esteja enfrentando a falta de fome após empilhar tantas taças. O próprio Domènec já mencionou o fato em duas entrevistas e disse que há vários exemplos no futebol. Não só concordo, como mencionarei dois bem próximos de nós, torcedores do Flamengo.

O primeiro é o legendário Flamengo de Zico, que, após conquistar o mundo, caiu de rendimento no segundo semestre de 1982, foi eliminado da Libertadores pelo Peñarol e perdeu a final do Estadual para um Vasco da Gama que vinha de nada menos do que cinco vice-campeonatos consecutivos pela competição, quatro para o Flamengo (78, 79, 79 e 81) e um para o Fluminense (80). Era o mesmíssimo time do Mundial, sem tirar nem pôr, e com certeza muito superior aos seus algozes, técnica e mentalmente. O segundo exemplo é o atual e fantástico Liverpool, que, já campeão inglês, tomou de 0x4 do Manchester City (32ª Rodada) e, semana passada, foi eliminado pelo Atlético de Madrid nas oitavas de final da Champions League. Trata-se de um relaxado Liverpool pós-título inglês depois de mais de duas décadas, fila maior do que a do Flamengo quando conquistou o Campeonato Brasileiro de 2009. Lembram do sufoco da partida final, do que estavam sentindo até o gol do Angelim? Pois é. O último título dos Reds havia sido conquistado na década de 80 (!) e a competição só viria a começar a ser chamada de Premier League no segundo ano da década seguinte. Por mais que seja uma ótima equipe, o Atlético de Simeone, em circunstâncias normais, não faria frente ao atual Liverpool, que tampouco tomaria de quatro de qualquer adversário, por mais que fosse o poderoso City de Guardiola.

Os atuais Liverpool e Flamengo terão que enfrentar o desafio de voltar a ter fome de títulos após o banquete de taças do mágico período entre 2019 e 2020, até a pandemia. Não estou defendendo que isso se torne uma muleta ou um salvo-conduto para Domènec Torrent, mas é preciso enxergar que o Ano Mágico rubro-negro acabou, que Jorge Jesus e Rafinha se foram e que nada será como antes. Aceitar essa realidade não quer dizer que o futuro não será bom, só que o Flamengo, e especialmente o treinador e o elenco, terão que ralar para tanto, pois a realidade presente é de queda de patamar, cenário que, não se esqueçam, precede a saída de Jorge Jesus, pois já se fazia presente no Estadual. Logo, é de obviedade ululante que não pode cair na conta de quem chegou do exterior há duas semanas. 

E aqui, mais uma vez, peço que tomem cuidado com as narrativas. Precisamos ter em mente que o Dome não é o Mister e talvez não seja boa ideia sequer ter esperança que possa alcançá-lo, ao menos num curto espaço de tempo. O Flamengo, Dome, os jogadores e a torcida terão que encontrar um novo caminho, que mal começou a ser trilhado neste cenário de estádios sem torcida, mas que necessariamente terá que ser percorrido. O futuro também poderá ser bom, mas com certeza será diferente. Assim é a vida e saber se adaptar é o segredo de viver bem.

Quarta-feira tem Grêmio e a palavra está com vocês.

Bom dia e SRN a tod@s.