segunda-feira, 24 de agosto de 2020

A Paciência que Jamais Tivemos

Salve, Buteco! Quando anunciou a escalação que entraria em campo contra o Botafogo, Domènec Torrent surpreendeu muita gente ao optar por deixar Gérson e De Arrascaeta no banco de reservas, e ao iniciar o jogo com o veterano Diego e o novato Pedro Rocha, que mal jogara sob o comando de Jorge Jesus. A dúvida passou a ser o desenho tático que o catalão escolheria. Para a minha agradável surpresa, o 4-3-3 com o próprio Pedro Rocha formando um trio pela esquerda com Diego e Filipe Luís criou boas chances de gol e marcou a superioridade do Flamengo durante a primeira metade dos quarenta e cinco minutos iniciais. O ex-Grêmio e Cruzeiro atuou com desenvoltura e de seus pés, após um desconcertante drible sobre Kevin, nasceu a melhor jogada de gol do primeiro tempo, num cruzamento certeiro para Bruno Henrique, que, centralizado no comando do ataque, infelizmente cabeceou em cima de Gatito Fernández. Do outro lado, porém, o trio Matheuzinho, Everton Ribeiro e Gabigol não só foi pouco acionado, como, a partir da segunda metade da primeira etapa, passou a se tornar o ponto vulnerável da equipe. O jovem lateral, que nos primeiros minutos parecia estar seguro como um veterano, inclusive arriscando um bom chute de fora da área, teve problemas com as investidas do Botafogo por seu setor, explorando o talento do promissor Luiz Henrique, que não à toa foi contemplado com a tradicional camisa 7 do adversário.

A missão de Matheuzinho foi ainda mais dificultada pela fraca atuação tática de Gabigol, completamente perdido dentro de campo. Como bem observou o Bruno Trink (@brunotrink), o ataque botafoguese "dobrava" em cima do nosso quase estreante lateral porque Gabigol não voltava para acompanhar, ao contrário do que corretamente fez Pedro Rocha no setor esquerdo, por onde o Flamengo não teve qualquer problema durante os noventa minutos. Foi nas costas de Matheuzinho que Luiz Henrique, após cruzamento de Kevin, penetrou na nossa área e, debaixo do gol vazio, isolou a gorduchinha para além das fronteiras da Via Láctea. E o primeiro tempo terminou com o Botafogo "crescendo no jogo", levando o Flamengo a descer para o vestiário com a preocupação de conter o ímpeto adversário.

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Os quarenta e cinco minutos finais foram um verdadeiro castigo para quem aprecia o bom futebol. Aliás, o horário de 11:00h é claramente contraprodutivo, uma verdadeira insanidade promovida pela caótica Confederação Brasileira de Futebol. Ambas as equipes perderam muito em intensidade e o jovem time do Botafogo, para o meu alívio, não apostou no desgaste rubro-negro e limitou-se a defender o placar de 0x0, postura que deixou o jogo um tanto amarrado, ainda mais pelas desorganização inicial e falta de intensidade do time rubro-negro, que voltou do vestiário com a mesma disposição tática, porém com alterações nos ocupantes de cada posição no ataque. Gabigol começou centralizado, com Pedro Rocha pela direita e Bruno Henrique pela esquerda. A experiência, definitivamente, não deu certo e o time, que já não havia feito uma boa metade final do primeiro tempo, só conseguiu concatenar as primeiras triangulações quando passou a adotar o 4-1-3-2, após as entradas de Vitinho e Thiago Maia no meio de campo. Numa das poucas boas jogadas, até chegou ao gol, corretamente anulado pelo VAR em razão de um toque involuntário de mão de Bruno Henrique dentro da área botafoguense.

Quando tudo indicava que a acomodada estratégia alvinegra daria certo, a sorte lhes sorriu numa sequência de escanteios, quando o time da estrela solitária, quase que despretensiosamente, encontrou o novamente caminho do gol nas costas de Matheuzinho. Dessa vez, porém, Pedro Raul não desperdiçou a chance, como havia feito o camisa 7, e num belíssimo voleio abriu o placar que, naquela altura, tinha cara de números finais da partida, para desespero da Nação Rubro-Negra. No sufoco, o Flamengo quase empatou, com Gabigol inacreditavelmente carimbando o travessão após o rebote de um cruzamento de Vitinho. Ato contínuo, Marcelo Benevenuto nos deu o pênalti da salvação, corretamente indicado pelo VAR e marcado por Leandro Pedro Vuaden. Como numa repetição de quarta-feira, nos minutos finais mais uma perfeita cobrança de Gabigol salvou o Flamengo da derrota.

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Nesse início de trabalho da nova comissão técnica, talvez o preparador físico Julian Jimenez, que chegou apenas na quinta-feira, dia 6 de agosto, é que terá o maior trabalho. Não vejo como o time possa exercer a marcação por pressão e, assim, jogar com intensidade por mais do que uma fração do primeiro tempo das partidas enquanto não resolver esse problema físico. Da parte de Domènec, foi boa a sacada de Pedro Rocha e o trio com Diego e Filipe Luís (que jogou de terno), apesar da fórmula perder força ao longo da primeira etapa e o desequilíbrio do setor direito. Já a volta para o segundo tempo foi preocupantemente confusa, em que pese, na sequência, as corretas substituições terem conseguido melhorar um pouco o rendimento que, no frigir dos ovos, mal chegou ao nível mediano.

Vejo esse ponto como o mais positivo desse início de trabalho, pois ontem todas as peças que entraram e eram subutilizadas nos tempos de Jorge Jesus acabaram correspondendo, casos de Matheus Thuler, Thiago Maia e Pedro Rocha, o que talvez sinalize para o catalão que existe vida no elenco além das estrelas que, visivelmente fora de forma, talvez sequer estejam devidamente motivadas. O caso de Gérson, aliás, parece ser o exemplo mais claro, ao menos para mim. Quem sabe o Thiago Maia? De qualquer modo, é bom que se tenha em mente que manejar um elenco bom como o rubro-negro não é tarefa tão simples como parece. Por exemplo, não dá para condenar quem, como no segundo tempo de ontem, aposta em dar mais ritmo especialmente a Bruno Henrique, todavia não é fácil aceitar que o melhor atacante do time na partida tenha sido o primeiro a ser substituído.

Falando em Bruno Henrique, ontem o nosso supersônico deu os primeiros sinais de reação e tentou superar os adversários em confrontos diretos, utilizando, além da habilidade, a velocidade e a força física que andavam, digamos, "sumidas", em local incerto e não sabido. Sem criar expectativas exageradas, espero que a semana sirva para o time melhorar o rendimento físico de todo o grupo, pois o calendário só dará outra "folga" como essa bem mais à frente.

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O certo, para mim, é que não há soluções mágicas a curto prazo. Como bem disse no Twitter o Ricardo Hinrichsen (@RicardoHinrics), "não sei se o Dome vai dar certo ou não. O que sei com certeza é que não quero voltar à mediocridade anterior da dança das cadeiras dos técnicos brasileiros, trocando os mesmos nomes a cada 6 meses. Chegamos onde chegamos pensando no longo prazo, não no dia seguinte." Ouso acrescentar que, para não retornar a esse círculo vicioso, que não raro era trimestral, em vez de semestral, precisaremos ter paciência em doses que jamais tivemos.

Ao Dome, deixo uma dica: o silêncio é melhor do que a repetição incessante de que precisa de tempo. Certas obviedades não deveriam ser explicadas e sim percebidas.

A palavra está com vocês.

Bom dia e SRN a tod@s.