segunda-feira, 2 de julho de 2018

Copas do Mundo

Salve, Buteco! Muitas baixas no elenco, apenas uma contratação (Fernando Uribe) e a Copa do Mundo comendo solta, com todos os campeonatos paralisados. Resolvi então dar um tempo do Mais Querido e uma palhinha aos amigos do Buteco sobre como vejo o torneio de futebol mais importante do futebol mundial. Desde 1982, ano da "Tragédia do Sarriá", nunca mais torci pela Seleção Brasileira com a mesma intensidade, e confesso que a partir de 2006 o interesse foi diminuindo, até que cheguei ao ponto de torcer contra a seleção de Dunga, símbolo do antagonismo a tudo o que se refere à Seleção de 1982, como nunca escondeu em várias entrevistas ao longo dos anos. São impressões puramente subjetivas, mas ainda assim compartilho-as com os amigos aproveitando o auge das especulações da segunda janela de transferências internacionais em 2018.

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Sempre achei o futebol brasileiro menos voltado para a tática, porém mais talentoso e criativo. Como não poderia deixar de ser, sempre tivemos tantos talentos individuais que os treinadores mais se preocupavam em ajustar o time para os talentos brilharem do que colocar o sistema tático em primeiro plano. Nenhuma crítica a essa postura, inclusive porque foi ela que colocou o futebol brasileiro como o líder de conquistas da Copa do Mundo, certo? Foi assim que assisti à minha primeira Copa do Mundo, em 1978, na qual curiosamente o escrete canarinho foi comandado por um dos treinadores mais capazes taticamente que o Flamengo e o futebol brasileiro já tiveram. Assisti perplexo as chances brasileiras serem aniquiladas pelo corrupto Argentina 6x0 Peru.

Quatro anos depois, o mestre Telê Santana montou uma equipe inesquecível, lembrada no mundo inteiro por quem realmente gosta de futebol bem jogado. Ocorre que, por conta da derrota de 1982, nosso futebol mudou um pouco e passou a incorporar algumas características do então modelo predominante no futebol europeu, consagrado pela conquista italiana, em detrimento de outras, latentes no escrete de 1982. Acredito que isso tenha se dado em razão da gigantesca expectativa (e posterior frustração) criada por uma seleção que levava o povo para as ruas dançar e festejar em pleno regime militar (ou ditadura, como queiram) com seu futebol mágico e espetacular.

Vejo 1986 como uma vã e iludida tentativa de ressuscitar uma geração já havia entrado em declínio após 1982. Também por isso, os times das Copas de 1990 e 1994 representaram o auge da "inversão" de estilos de jogo. Tomando 1982 como marco, foi como ir de um extremo a outro sem muita reflexão. Foram as seleções das quais menos gostei até hoje.

Com Zagallo em 1998, achei a seleção mais solta e ofensiva, seguindo nossas tradições, curiosamente com o treinador que em 1970 e 1974 por muitos foi criticado por uma postura "defensiva", e penso que Luís Felipe Scolari chegou a um interessante "meio-termo" em 2002, montando um sólido esquema defensivo para os talentos ofensivos brilharem. Comparo 2006 a 1986: seleções que esbanjavam talento, porém sem identidade, perdidas entre a falta de renovação e jogadores em declínio e/ou mais preocupados com a vida noturna do que com o futebol profissional. A seleção de 2010 eu odiei profundamente e não escondo que torci por sua ruína, muito por conta de seu treinador, cuja filosofia, ao meu ver, revivia o estilo de jogo das Copas de 1990 e 1994. Já em 2014, bem, até que tentei torcer, mas...

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Após a Copa/2002, a primeira década do Século XXI marcou um forte declínio do futebol brasileiro, que acelerou seu processo de empobrecimento tático e técnico, muito por conta do êxodo de jogadores para outros centros mais fortes financeiramente após a vigência da "Lei Pelé", que extinguiu o direito de "passe" e criou os "direitos federativos". Então, enquanto as Copas de 1978 e 1982 foram marcadas como as últimas com quase 100% de jogadores atuando no país, as Copas seguintes paulatinamente estabeleceram uma relação inversa: a convocação de jogadores que atuam no futebol nacional passou a ser literalmente uma espécie de anormalidade. E para piorar, os treinadores brasileiros, sem os talentos individuais para formar as equipes, tornaram-se neste século absolutamente obsoletos. Até o visivelmente decadente futebol argentino, vítima do mesmo processo de "exportação de talentos", tem vários profissionais trabalhando em grandes equipes no primeiro mundo do futebol e uma formação de treinadores mundialmente reconhecida.

Enquanto isso, ora vejam só, o rico futebol europeu, principalmente na Espanha e na Alemanha, resgatou várias características do antigo futebol brasileiro, rara e pontualmente presentes fora do país, como em seleções do naipe da holandesa de 1974. Treinadores como Pep Guardiola trataram de unir a tática e a técnica, o talento individual a serviço do coletivo, sem perder sua capacidade de encantar e decidir.

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Chegamos então a 2018. Em meio a esse quadro, vejo no crescimento de Tite como treinador um marco para o futebol brasileiro. Vejam bem, não se trata de endeusar o nosso treinador de frases complicadas e muitas vezes caricatas, ou mesmo sua perceptível predileção por "panelas", característica, aliás, presente em 99% dos treinadores nacionais. Cuida-se do primeiro profissional que conseguiu se "atualizar" e começar a se nivelar com o que é feito no que hoje chamo de primeiro mundo do futebol, do qual certa época, que felizmente vivenciei, o Brasil já fez parte.

Como a Seleção Brasileira influencia muito o estilo de jogo aplicado em nossos gramados, vejo no sucesso de Tite, que para mim está próximo do equilíbrio de 2002, mas com mais sofisticação tática e alternativas (falta algumas peças funcionarem), uma oportunidade para um recomeço e resgate de importantes valores que sempre fizeram parte do futebol nacional.

É claro que tudo isso precisa ocorrer sem prejuízo da "faxina" que precisamos fazer em âmbito administrativo na Confederação Brasileira de Futebol, internacionalmente investigada. Porém, isso é assunto para outro dia.

Bom dia e SRN a tod@s.