E eles vieram.
Muitos
não acreditavam, mas eles atenderam ao chamado.
Chegaram
de todo lado, cantando, batendo palmas, assobiando, soltando fumaça,
empunhando suas bandeiras, munidos de pouco mais que os pulmões
plenos de vontade de soltar suas vozes.
Eles
não vão às boutiques oficiais. Eles não são associados. Eles não
se engalanam com as vestes de alto padrão. Eles se bastam com
qualquer trapo em negro e vermelho.
Eles
não tomam cerveja artesanal, não comem coisas gourmetizadas, não
sabem o que é “otimizar experiências”. Eles desconhecem os
lounges, os espaços restritos, nunca ouviram falar em “Fla
Experience”.
Eles
não pagam pay-per-view, eles não usam streaming, eles não recorrem
a tablets ou outras engenhocas eletrônicas. Eles ainda são do
rádio e da tevê.
Eles
não sabem o que é mapa de calor, oferta de linha de passes,
diagonal de cobertura. Eles desconhecem futebol reativo, eles ignoram
a saída lavolpiana, eles mal ouviram falar de Klopp e Mourinho.

Vivemos
tempos de “entertainment”. De futebol-business. De mais dinheiro
girando no negócio, de estádios que fediam a mijo, infestados de
baratas, hoje arenas confortáveis e mesmo luxuosas. Do churrasquinho
de origem duvidosa que deu lugar a sushis e burgers gourmet. Da
cerveja quente que virou “Pale Ale com notas de coentro e lima da
pérsia”. Do público que vai pra ver e ser visto. Que tira selfie
e posta no insta. Dos serviços melhores (em tese), e dos custos a
eles inerentes. Da captação de clientes com poder aquisitivo
suficiente para fazer girar o negócio. E o Flamengo mergulhou nesse
contexto. E, aparentemente, com gosto e afinco.

Porque,
depois de desfrutar de todo o conforto, a tranquilidade, as
facilidades, os mimos e mesmo a eventual sofisticação de alguns
aspectos secundários, de repente se descobriu que eles ficaram de
fora. Eles. Justamente eles, os que trazem o colorido, a pulsação,
o ritmo, a vida a uma partida de futebol.
Justo
eles, que trazem o amor.
Eles
cantam ao mundo inteiro a alegria de ser rubro-negro. Avisam que
“onde estiver” querem estar, profetizam que “vamo ser campeão”,
levantam poeira, soltam fumaça, gritam o nome de todo e qualquer um
que esteja ali dentro representando o bastião inexpugnável
flamengo.
Eles
não se revestem da renitente neurastenia dos baluartes das redes
sociais. Eles não problematizam. Eles torcem. Se está bem, cantam e
festejam. Se está mal, vaiam e apupam. Mas sempre estão prontos a
estender as mãos, a fazer a secular diferença que sempre fez do
Flamengo a mais expressiva instituição esportiva do território
nacional.

Eles
querem que o Flamengo volte a se deixar amar, como sintetizava Mário
Filho. Não querem ser “off-Rio” no Rio de Janeiro.
O
Flamengo vive um momento de incertezas, de crise de identidade. Não
por acaso, de escassez de glórias. E eles estão aí, em massa,
urrando a todo o mundo qual é o caminho. Suplicando que os ouçam.
Que os deixem se fazer presentes. Porque eles são a Maior e Melhor
Torcida do Mundo. Eles são a diferença. Eles são todos menos
alguns. Eles são, em essência, o próprio Flamengo.
Eles
somos nós.