Saudações flamengas a todos,
E chegamos ao G4, contra todos os
prognósticos, como bem apraz ao Flamengo. A 14 rodadas do final, o rubro-negro
entra em uma briga que se desenha renhida, coalhada de batalhas dentro e fora
do campo. Que tenhamos força para vencer essa luta. Venceremos.
A torcida parece estar começando
a comprar esse time. Está estendendo a mão, e os jogadores, dessa vez, parecem
dispostos a segurá-la firmemente. E, quando essa aliança se consuma, se
consolida, produz momentos inesquecíveis. Os pontos de coesão. As fagulhas. A
ignição. O mágico instante em que time e torcida passam a acreditar solidamente
na conquista, na glória, no êxito. A hora em que ser Flamengo passa a se tornar
algo biológico, orgânico, amalgamado em nossas mais profundas entranhas. O time
e seu torcedor se transfundem em uma só entidade.
Trago aqui hoje alguns desses
momentos, passagens que se tornaram eternizadas ao longo da história. Que em
2015 possamos viver algo semelhante.
* * *
FLAMENGO 5-1 CORINTHIANS, Campeonato Brasileiro 1983,
Terceira Fase
Com o Campeonato Brasileiro
chegando à reta final, nada parece indicar que o Flamengo despontará como um
dos candidatos ao título. O time parece imerso em uma letargia iniciada desde a
eliminação na Libertadores do ano anterior, e nada parece reerguer a sua flama
inicial. Os jogadores parecem gravitar inertes, desmotivados, sem vontade. Com
efeito, a equipe ainda não conseguiu empolgar seu torcedor em NENHUMA partida
da competição, salvo alguns lampejos de bom futebol no frustrante empate em 1-1
com o Palmeiras, no Maracanã, pela fase anterior. O desgastado Carpegiani, o
inexperiente Carlinhos e o interino Cléber Camerino não conseguem fazer a
equipe render sequer traço do que pode. Até que chega Carlos Alberto Torres,
que só precisa de um treino e uma preleção para operar o verdadeiro milagre de
tornar o time pilhado, motivado e com fome. A torcida parece pressentir, e 90
mil vão ao Maracanã. E o Flamengo simplesmente esmaga, atropela, passa por
cima, não toma conhecimento do Corinthians de Sócrates, aplica históricos 5-1,
goleada que não é ainda mais ampla porque o árbitro gaúcho Roque Gallas
simplesmente se recusa a validar os dois gols legítimos que são marcados após o
quinto tento. Essa é considerada uma das mais perfeitas atuações da Era Zico. O
futebol jogado é de uma qualidade tão cintilante que mesmo o reticente Márcio
Guedes, empedernido botafoguense que comenta o jogo, solta-se das amarras e
brada ao microfone: “pintou o campeão”. E está certo. A goleada marca o início
de uma arrancada retumbante, revestida de outras atuações (quase) tão
perfeitas, especialmente no Maracanã, que rebentarão na conquista do
tricampeonato brasileiro.
FLAMENGO 2-0 PALMEIRAS, Campeonato Brasileiro 1987,
Primeira Fase, Segundo Turno
O estrelado time do Flamengo não
está pronto. Longe disso. Até exibe certos momentos de bom futebol,
especialmente pelos pés do esfuziante Renato Gaúcho e do cerebral Andrade, mas
a sensação é que falta algo. O time se recupera da medíocre campanha do
primeiro turno, mas ainda é instável, irregular, chega à quarta rodada com 1
vitória, 1 empate e 1 derrota. A partida contra o Palmeiras é tida como
importante, pois o alviverde aparece como concorrente direto a uma vaga para as
Semifinais. Zico retorna, e com isso Carlinhos dispõe, enfim, de todos os seus
titulares. O Flamengo demora a entrar no jogo, o início é algo claudicante.
Mas, quando encaixa, a equipe desliza em campo e não toma conhecimento do
adversário. Em um festival de jogadas de efeito, lances desconcertantes e o
trio Renato-Zico-Bebeto se mostrando simplesmente imarcável, o Flamengo faz 2-0
e transforma o goleiro palmeirense em uma das grandes figuras do espetáculo. O
público, ainda razoável (32 mil, até bom, em se tratando de uma tarde de
sábado), sai extasiado do Maracanã, e os comentaristas que acompanharam a
partida demonstram estar impressionados com a atuação. O Flamengo, a partir
dessa vitória, arrancará de forma fulminante e emocionante para o tetra
brasileiro. E passará meses até que volte a ser derrotado, já sem o Galinho na
equipe.
FLAMENGO 4-3 FLUMINENSE, Campeonato Estadual 2004, Taça
Guanabara
É apenas o quarto jogo da
temporada, o terceiro oficial. O time, barato ao extremo e ainda em formação,
vem de um frustrante empate no Maracanã contra o Friburguense, partida em que o
lateral Roger foi ostensivamente vaiado. O jogo seguinte é contra o caríssimo
Fluminense que monta uma “seleção” com jogadores como Romário, Edmundo,
Petkovic, Léo Moura, Ramón, entre outros. O tricolor, melhor na partida, abre
3-1, em atuação de gala de Romário, com direito a olé, mesmo no início da
segunda etapa. Mas o Baixinho sente lesão e sai. Logo depois, Felipe diminui. É
a senha. A massa flamenga desperta e assume a bronca. Vai virar o jogo na
marra. O auto-suficiente adversário se encolhe, apavorado. E o Flamengo cresce
como uma sombra onipresente que vai ocupando, amplificando-se, instalando-se
por todo o campo. A torcida sabe, os jogadores sabem, o adversário sabe, a
cidade, o país, o mundo sabe que o jogo vai virar. E se dá o que estava
escrito, pelos pés do outrora massacrado Roger que, com dois gols, consuma o
desfecho de um dos mais espetaculares clássicos Fla-Flu de toda a história. A
Nação, ao som de “Poeira, levantou poeira”, ali, em plena terceira rodada,
decreta que o Flamengo é o campeão. Nem que São Judas tenha que calçar
chuteiras. O campeonato ainda durará mais dois meses, mas os jogos serão mera
formalidade. O Flamengo é o campeão, título conquistado naquele Fla-Flu da
Poeira.
FLAMENGO 1-0 SÃO PAULO, Campeonato Brasileiro 2007
A ameaça do rebaixamento ainda
existe, mas vai se tornando cada vez menos palpável, o que não deixa de ser um
alívio para uma torcida que andou realmente preocupada com a persistência da
equipe nas últimas colocações (chegou a ser o lanterna) e, principalmente, com
o indigente futebol praticado. Chegam reforços importantes (Ibson, Fábio
Luciano, Cristian, Maxi), o treinador Joel Santana, heroi da fuga de 2005, está
de volta, e, após algum sofrimento inicial, o Flamengo começa a exibir certo
padrão de jogo, baseado na solidez do sistema defensivo e na velocidade dos
insinuantes alas Leonardo Moura e Juan. O Flamengo começa a ostentar resultados
positivos com frequência (1-0 Fluminense, 4-0 Juventude, 3-1 Cruzeiro, entre
outros menos cotados), mas ainda falta a real demonstração de força. E ela virá
na partida contra o São Paulo, líder disparado e virtual campeão, com uma
defesa vazada apenas 7 vezes, que chega ao Rio com o status de equipe quase
imbatível. E, exibindo uma determinação absurda, o Flamengo joga no seu limite
extremo e simplesmente faz emperrar o celebrado esquema de Muricy Ramalho.
Enlouquecida, a torcida (quase 70 mil) canta, pula, grita que “onde estiver,
estarei”, protagoniza o grande momento esportivo do ano. E recebe seu prêmio quando,
numa infiltração, Ibson marca o gol da vitória. No fim, a certeza de que o
rebaixamento ficou para trás. E é hora de pensar em um objetivo mais audacioso.
Sim, a Libertadores é logo ali.
FLAMENGO 2-1 SÃO PAULO, Campeonato Brasileiro 2009
O time melhorou. Isso é evidente.
Quem viu as claudicantes atuações dos tempos do Cuca, ou mesmo do início do
trabalho do Andrade, e agora vê a equipe passando o trator contra Santo André,
Sport e Coritiba nota rapidamente a diferença, certamente ocasionada pela chegada
de Álvaro e Maldonado, pela recuperação do habilidoso Zé Roberto e pela
efetivação do veterano Petkovic no time titular. Mas ainda existe certa
desconfiança. Alguns aduzem que “quando esse time enfrentar os cabeças irá
chegar ao seu limite”. Chega a partida contra o São Paulo. Adriano está fora,
na seleção. O esforçado Dênis Marques é seu substituto. Mas o Flamengo ignora a
ausência de seu principal atacante e vai pra cima. Vai pra dentro. Cria pilhas
de gols perdidos. Numa falha, o adversário sai na frente. O time não se abate,
segue em cima. Segundo tempo. Quando enfim o rubro-negro parece ceder ao
cansaço físico e mental (a bola simplesmente não entra), vem o pênalti.
Petkovic cobra, Ceni se adianta e defende. Corajosamente, o auxiliar desafia o
“favorito” dos bastidores e corretamente impugna o lance. “Pai, f-se o
pênalti”. E Pet dessa vez não perde. A humilhante cavadinha enlouquece os 60
mil. Vai virar, tem que virar. Pet de novo. Açúcar. Faz, meu filho!. E Zé Roberto não vai
decepcionar. 2-1. Iremos repetir 2007. Ou talvez não. Talvez venha algo ainda
maior. Não tem mais volta.
FLAMENGO 4-0 BOTAFOGO, Copa do Brasil 2013,
Quartas-de-Final
Tudo parecia ir bem após a
heroica vitória contra o multi-favorito Cruzeiro, na fase anterior da Copa do
Brasil. No entanto, a súbita debandada do treinador Mano Menezes provocou um
perigoso momento de instabilidade, num período em que a posição na tabela do
Brasileiro ainda apontava uma distância demasiadamente curta da Zona do
Rebaixamento. O auxiliar Jaime de Almeida assume e consegue canalizar a
estupefação com a saída do antigo comandante e a revolta com as críticas da
imprensa e torcida (“é o pior time da história”) para dentro de campo,
convertendo a indignação em competitividade. E, por alguns meses, o Flamengo se
torna uma equipe insinuante, aplicada, organizada e qualificada, praticando um
futebol de primeira linha. As vitórias aparecem, e o perigo do descenso vai
sendo rapidamente afastado. Chega o jogo decisivo da Copa do Brasil contra o
Botafogo. Agressivo, ofensivo, disposto a matar o confronto no tempo normal, o
Flamengo engole o vacilante adversário. O ponta Paulinho emula Garrincha e
protagoniza a mais brilhante atuação individual da história do Novo Maracanã.
As chances vão sendo criadas e o goleador Hernane, em noite de gala, vai
simplesmente empurrando pro gol as bolas que lhe aparecem. A goleada é tão
tranquila que ainda sobra tempo para uma homenagem ao aniversariante Léo Moura,
que ganha um pênalti de presente para celebrar junto aos eufóricos 60 mil. Os
4-0 transmitem confiança ao Flamengo. A taça está logo ali. E alívio ao
Botafogo, não foi de seis. Mas chegou perto disso.