terça-feira, 7 de julho de 2015

Processos e Inteligência à Serviço do Futebol

Em momentos de crise, a revolta é o caminho mais curto, mas nos últimos anos, alargando, neste século o Flamengo só anda em crise. Algo deve ser feito para que se evolua positivamente. Além das medidas corretas, na tomada do rumo certo, penso que a criação de processos internos, claros, facilitem a tomada de decisões e a avaliação de todos os fatores envolvidos. Os positivos e os negativos, para a reprogramação e mudança de rotas, quando necessárias forem. Para isso, o paradigma deve mudar, pois não conheço, nem reconheço, de fora, no futebol do Flamengo os tais processos claros e a utilização plena da inteligência a serviço do futebol do clube.

Leila Souza em um artigo, descreve com base em autores da área administrativa para que servem os processos e como utilizá-los na solução de problemas e na autoavaliação constante. Para ela, controlar a qualidade é “Planejar, Manter e Melhorar Constantemente”, através das seguintes etapas:

1. Identificação do Problema: Qual a frequência do problema? Como ocorre? Estabelecer uma data limite para se ter o problema solucionado;
2. Observação: Investigação;
3. Análise: Formação do grupo de trabalho, reuniões participativas (brainstorming);
4. Plano de Ação: Elaboração da estratégia, certificar as ações sobre causas, não sobre efeitos, Propor soluções diferentes, Fazer cronograma, orçamento e metas;
5. Ação/Execução: Bloquear causas através de treinamento, Corrigir para que problemas não ocorram pelas mesmas causas;
6. Verificação: Avaliar os resultados;
7. Padronização: Elaboração ou alteração do padrão. Esclarecer no procedimento operacional “o que”, "quem", "quando", "onde", "como" e principalmente "por quê", para as atividades que efetivamente devem ser incluídas ou alteradas nos padrões já existentes. Evitar que o problema resolvido reapareça devido à degeneração no cumprimento dos padrões, estabelecendo um sistema de verificação periódica.
8. Conclusão: Efetuar relação dos problemas remanescentes, planejar ataque a estes problemas, Analisar etapas executadas na metodologia.

Parece simples, não? Para nossas vidas cotidianas, no mercado de trabalho, pode ser... Estas etapas devem se fazer presentes no futebol, talvez estejam lá e não conseguimos enxergar, talvez não as existam, mesmo. Caso existam, tenho sérias dúvidas de que estejam funcionando plenamente. A repetição de problemas temporada a temporada, como a má formação do elenco para o Campeonato Brasileiro, a troca constante de treinadores, a não formação de atletas que possam suprir necessidades momentâneas na base no time principal, etc; trazem o questionamento dos métodos de trabalho do departamento de futebol.

Precisamos trabalhar com inteligência. O que é inteligência, na verdade? Essa pergunta é chave para se entender o porque, na minha opinião, do futebol não caminhar no Flamengo. Antes de recomeçar, me aterei a alguns conceitos do assunto, como um todo, por artigos e links sobre o assunto. A inteligência e a gestão de dados, caminham juntas no mundo empresarial e no futebol. Não é novidade para ninguém. O problema é como estão funcionando (ou não) no nosso futebol.


• Melhor alinhamento entre as áreas de tecnologia e de negócio;
• Conhecimento dos dados através da adoção de vocabulário único;
• Melhoria na qualidade e confiabilidade dos dados e informações através do uso de dados cada vez mais claros, precisos, íntegros, integrados, pertinentes e oportunos;
• Criação da cultura do uso de indicadores de processo e qualidade dos dados;
• Reutilização de dados considerados corporativos, contribuindo dessa forma para a melhoria da qualidade dos dados e também reduzindo os esforços, tempos e custos do desenvolvimento de novas aplicações;
• Redução dos riscos e falhas no desenvolvimento dos sistemas e aplicações;
• Eliminação na quantidade de informações redundantes;
• Estabelecimento de mecanismos formais de segurança, acesso e disponibilização a quem realmente necessita;
• Aumento da produtividade das pessoas que utilizam os dados e as informações.

Os benefícios citados resultam em vantagens competitivas. Estes são alguns dos motivos que norteiam uma mudança de paradigma no futebol do clube, nos bastidores, no que não se consegue enxergar das arquibancadas. Wellington Felix, apresenta em Introdução à Gestão da Informação, uma tabela que ajuda a entender o processo de gestão da informação para a gestão do negócio, como um todo. Vejam:
inteligencia
Fonte: Felix, 2003, páginas 37 e 38
Andrey Freitas, diz em outro artigo, que a “inteligência é o conhecimento que foi sintetizado e aplicado à determinada situação, baseada na experiência e intuição. Podemos dizer que inteligência seria ministrar um medicamento à pessoa com febre, ou qualquer outra iniciativa, com base na sua experiência”. Após a descrição, ele apresenta os cinco níveis hierárquicos de uma métrica:

Dado: é a matéria-prima que será utilizada na produção de informações. Por si só, os dados são essencialmente inúteis porque falham em transmitir qualquer informação útil.
Medida: cada medida é composta de um ou mais dados. Medidas trazem clareza, agrupando-os em relacionamentos reais e adicionando-os contexto.
Informação: é o resultado do processamento de uma medida. A informação adiciona contexto na forma de significado, tornando assim as medidas compreensíveis.
Conhecimento: é a avaliação da informação, sua relevância e importância, por isso a transformação da informação em conhecimento depende do background do receptor
da mesma quando a interpreta.
Inteligência: é o conhecimento que foi sintetizado e aplicado à determinada situação.
Chegamos enfim ao ponto principal, o de como sairemos da mesmice, do lugar-comum para transformar o futebol do Flamengo em um sítio de trabalho e vanguarda, com resultados efetivos no campo de jogo. Com Processos e Inteligência. Nos dois sentidos do termo, no amplo, o das informações e no estrito, o do tratamento do conhecimento, individual, de cada peça da engrenagem. Só assim sairemos da crise constante, estaremos preparados para mudanças de rota com maior facilidade. A outra ponta do processo, para que paremos de correr atrás do rabo, é a estruturação e a responsabilização dos entes envolvidos. Na questão da estrutura, novamente falo de dois sentidos, no da estrutura física e nos recursos humanos.

A estrutura é importante, os atletas têm que ficar no CT. Por isso, o treino “tradicional” deveria ser, em minha limitada visão, “obrigatoriamente” pela manhã. Todos os outros trabalhos (recuperação, reforço, bola parada... seriam pela tarde). O atleta tem sim que ficar no clube ao menos de 8hs até as 15hs. Foco total na profissão, no rendimento, no crescimento individual, pra melhorar o desempenho coletivo. Lembremos que o trabalho coletivo é a soma das individualidades. O elenco profissional do Flamengo estaria em condições normais entre os 10 melhores do campeonato, se estivesse rendendo minimamente (nem falarei de salários em dia...). Não é o que estamos vendo, nem o que temos visto nos últimos anos.

Para ser mais objetivo, pretendo especificar o que penso para cada função e criar um processo de avaliação que resulte em melhora do desempenho do departamento de futebol. Sei que algo simplório, não tenho certeza se existe no Flamengo, mas ouvi no “Resenha ESPN”, Muricy Ramalho dizer o que funciona no São Paulo. Para isso, separei o departamento basicamente em cinco níveis (logicamente existem entremeios, funcionários de outras funções) são eles: os Atletas, a Comissão Técnica, o Superintendente (da base e profissional, uma para cada setor), o Diretor de futebol e o Vice-Presidente ou o Conselho Gestor do Futebol e o Conselho Diretor do Clube (CoDi).

Atletas
Muricy disse que no São Paulo existem relatórios individualizados de pós-jogo para os atletas, onde apenas os atletas conhecem seus próprios resultados (nenhum companheiro sabe do resultado de outro atleta, a não ser que conversem entre si). Isso é ótimo! Mas para se formar uma cultura de análise no Flamengo, estes relatórios deveriam ser escalonados de baixo para cima, criando processos de análise menos subjetivos, baseados no desempenho.

Os atletas deveriam responder a questionários curtos com perguntas e respostas objetivas, diariamente, sobre seu estado físico, técnico, mental e estratégico (funcional, tático). O atleta tem que ter a capacidade de se autoavaliar, de criar esta responsabilidade com seu papel profissional. Estes relatórios individuais seriam analisados pela comissão técnica. Além disso, dentro destes “novos processos”, os auxiliares, fisiologistas, analistas de desempenho e os preparadores físicos seriam de grande importância, fazendo trabalhos individuais e com grande sentido coletivo, imposto pelos trabalhos do dia a dia.

Os atletas teriam mais tempo para entregar a estes relatórios individuais, analisar vídeos, corrigir postura, gestos técnicos e fatores individuais e coletivos dentro e fora do campo, com vídeos, conversas e treinos específicos no campo. Evoluir profissionalmente, estudar, pensar o jogo.

Comissão Técnica
Basicamente, neste formato de relatórios e análise de dados e inteligência, a comissão trabalharia maciçamente com o treinador, seus auxiliares técnicos, os fisiologistas, os preparadores físicos e os analistas de desempenho. Estes tem como missão, além das responsabilidades “normais”, analisar coletivamente o grupo, coletar informações, preparar relatórios semanais e pré e pós-jogo para que o Supervisor auxilie em discrepâncias do processo. Não seria assim, tão simples derrubar o treinador e a comissão técnica ficaria mais forte perante o grupo de jogadores.

É de suma importância este fator estratégico. Pode parecer que a responsabilidade sobrecarregaria a Comissão Técnica, mas pelo contrário, os atletas teriam que dividir a responsabilidade, pois ficaria mais nítido o compromisso ou descompromisso dos atletas. Quanto menos subjetiva, mais fácil de se detectar fatores externos que atrapalham o desempenho.

Supervisor
Tem como função, receber e analisar os relatórios semanais e os de pré e pós-jogo da comissão técnica e preparar relatórios quinzenais para o Diretor de futebol. Também prepararia os relatórios dos atletas, questionários curtos, ajudando na avaliação coletiva, junto com a comissão técnica. Pode produzir os relatórios de todo o elenco, até para saber o porque de certos atletas não tem sido relacionados ou até o não funcionamento de algumas “peças” não funcionam.

Analisará de perto o trabalho da comissão técnica e dos atletas, sendo o elo entre os atletas, a comissão técnica e o Diretor de futebol. Mais ou menos o que fazia Paulo Pelaipe. As categorias de base teriam seu supervisor específico. Como sugestão tenho o próprio Muricy. Não se desgastaria tanto com o campo e bola, preservaria sua saúde e trabalharia no Rio de Janeiro onde morou. Com um projeto bacana, acho que aceitaria. Para as categorias de base, sugiro uma dupla: Jayme de Almeida e Adílio, treinados para ocupar tal função.

Diretor de Futebol
A peça mais importante do sistema, fará funcionar o departamento de futebol, controlando o setor com a autonomia e a cobrança necessária. Controle total de orçamento e gestão. Tem como meta ordenar a base e o futebol profissional com estes controles de inteligência aplicados, tornando o trabalho menos subjetivo, como disse acima.

Contratará o Supervisor para gerir o trabalho, uma comissão técnica fixa do clube, procurar profissionais de ponta, ampliar o trabalho dos analistas de desempenho e a base de dados levada a sério, buscar profissionais qualificados, na academia, principalmente alguns que tenham curso fora do país, ampliar o trabalho dos olheiros, trazer treinadores funcionais, para rever e consertar movimentos dos atletas. Na base e para os profissionais. Treinador de zagueiros, laterais, atacantes... O treinador só trará para o Flamengo um auxiliar técnico e seu analista de desempenho. Os relatórios do Diretor de futebol serão mensais e não ao sabor dos ventos.

Vice-Presidente ou Conselho Gestor do Futebol
Em princípio gosto da ideia de se trabalhar com conselho de futebol. Desde que o gerente de Futebol tenha autonomia de gestão. O conselho serve para impor metas, criar rotas, implantar filosofia, definir estio de jogo, etc. mas deve dar autonomia. O bom do modelo é não recair sobre uma única pessoa a responsabilidade de conduzir o processo. O que não pode virar é um “conselho de palpiteiros”.

Conselho Diretor do Clube (CoDi)
Este aspecto contou com o feedback do próprio texto, nos comentários enviados no blog e dos amigos por whatsapp. A tarefa mais importante é a do Conselho Diretor. Ela está no centro da questão, a reaproximação entre clube e torcida/consumidor, como no sentido antigo de Religião (religação). A tarefa é criar e comunicar uma identidade Rubro-Negra. A apresentação de “Missão, Visão e Valores”, que o clube pretende, o que quer ser, como fazer e onde deseja chegar. Com metas e períodos a se cumprir. Aí sim, todas as peças da cadeia, de cima para baixo poderiam ser avaliadas com justiça, sem subjetividades, por um projeto completo de gestão do Futebol do Flamengo.

Todos os agentes teriam suas responsabilidades e funções ampliadas, porém divididas. Geralmente, a maior responsabilidade recai sobre o treinador. Talvez isso mude um pouco. Pode também ser o momento de se tentar um treinador estrangeiro para implementar diferentes métodos, buscar o intercâmbio, ser vanguarda de fato e de direito, em conceitos sólidos, ao mesmo tempo criando a identidade do Clube de Regatas do Flamengo. Os processos somados a inteligência tem o papel de transformar as decisões do futebol mais técnicas, objetivas, menos subjetivas, ao sabor das vontades pessoais. Isso protege o sistema, aperfeiçoa os métodos de trabalho, previne desastres, define objetivos e como alcançá-los. O caminho da busca da excelência fica um pouco mais curto. Tem que se planejar e executar melhor.