domingo, 11 de agosto de 2013

Alfarrábios do Melo

Saudações flamengas a todos,



Nunca um processo é imediato. E o estágio inicial é sempre o mais complicado. Porque, sem os resultados imediatos, surge toda sorte de questionamentos.

Por conta disso, hoje deixo uma história interessante, para que os mais antigos recordem e os mais novos conheçam. Boa leitura.

Os Campeonatos Brasileiros de 1977 e 1978

“É inadmissível o Flamengo disputar Campeonato Brasileiro como coadjuvante. Lugar do Flamengo é no topo, seja do Brasil, da América ou do Mundo.”

Em que pese a audácia do novo presidente, o novo Flamengo pouco suscita suspiros de protagonismo. Ganhar tudo é a ideia, mas a realidade é exprimida cruamente em um time jovem, repleto de juniores e jogadores baratos. Sem capacidade de investimento, não há outra alternativa senão buscar um paciente trabalho de montagem, comandado por um treinador talentoso mas inexperiente, Cláudio Coutinho. É bem verdade que a safra de garotos é tida como promissora (Adílio, Andrade, Júlio César, Tita, Júnior Brasília, entre outros), mas ainda são jovens, não se pode sustentar em suas costas o peso de atuar no Flamengo.

As únicas unanimidades são Zico, Júnior e Toninho, justo os “craques de seleção”. A esses, juntam-se o voluntarioso Rondinelli, o líder Carpegiani (trazido quase de graça do Inter por conta de seus recorrentes problemas de lesão), outros nomes como Valdo (vindo do Joinville-SC), Luís Paulo, Merica, e as novas contratações, o atacante Cláudio Adão, igualmente recuperado de séria lesão, trazido do Santos, e o uruguaio Ramirez (para a reserva de Toninho, em tempos de Copa do Mundo). Completam o elenco apostas baratas como Osni (Bahia) e Dequinha (filho do craque dos anos 50, de mesmo nome). Nenhuma estrela de primeira grandeza, nenhuma contratação vultosa. Não há dinheiro. Desconfiado, o torcedor questiona esse tal “protagonismo” da nova diretoria.

Mas a equipe até começa bem o Brasileiro. Com atuações convincentes, consegue várias goleadas (5-0 Vitória-BA, 6-0 Fluminense-BA, entre outras), mas os resultados discretos contra as equipes mais fortes de seu grupo (0-0 Bahia, 1-1 América, 1-2 Fluminense) já sinalizam perspectivas não muito luzidias. De qualquer forma, o time termina a primeira fase em primeiro lugar no seu grupo.

O Flamengo também vai bem e vence seu grupo na fase seguinte. É verdade que perde para o XV de Piracicaba (0-1, no interior paulista), resultado que causa certo burburinho, mas uma expressiva vitória sobre o Cruzeiro de Nelinho (3-1, para 80 mil no Maracanã) já começa a trazer certa empolgação para o torcedor. O time agora vai para a terceira fase, e se passar já chegará às Semifinais.

No entanto, é nessa fase que as limitações de um grupo jovem e com poucas alternativas aparecem. Após empatar com o Vasco (0-0, 102 mil), o time perde para o Londrina (0-1) no Paraná e se vê pressionado a derrotar o fraco Caxias-RS no Maracanã. A imprensa fala abertamente em goleada, e efetivamente uma boa diferença de gols dá ao vencedor um ponto a mais, pelo regulamento. No entanto, o Flamengo, preocupado apenas em ganhar de muito, não administra bem a forte retranca montada pelo adversário e se descontrola após sofrer um gol em contragolpe. Zico ainda empata, mas o time é traído pelos nervos e sai do Maracanã com um empate em 1-1 que praticamente o alija da competição. Precisando golear os adversários restantes, o Flamengo perde a motivação e soma apenas um ponto (0-0 Santos, 0-1 Corinthians), sendo eliminado e terminando o Brasileiro em nono lugar.

Não há muito tempo para lamentar, pois poucas semanas depois já terá início o Brasileiro seguinte. Exatamente 35 dias após ser eliminado da competição de 1977, o Flamengo estreia enfrentando o Fluminense, já pelo Nacional de 1978.

Dessa vez o Flamengo derrota o rival (1-0) e larga bem no campeonato. E, tal como no ano anterior, faz boa campanha na Primeira Fase, vencendo com larga margem sua chave. Além da vitória no Fla-Flu, destaque para as difíceis vitórias contra Portuguesa (2-1 no Maracanã) e Remo (1-0 em Belém), além da goleada sobre o Bangu (4-1) que “revelou” o jovem Radar, autor de quatro gols e rapidamente promovido a celebridade instantânea. O destaque negativo é a derrota (2-3) para o América, em uma bela e aberta partida.

Na Segunda Fase, começam os problemas. Sem Zico e Toninho, servindo à seleção, o Flamengo faz uma campanha extremamente irregular. Atua bem nos empates contra Corinthians (1-1 no Morumbi) e Botafogo (1-1), mas tropeça contra Operário-MS, Comercial-SP, perde novamente para o América (0-2) e somente consegue sua vaga através do índice técnico. O time base que vai a campo nessa fase é formado por Cantarele, Ramirez, Rondinelli, Dequinha e Júnior; Merica, Carpegiani e Adílio; Júnior Brasília, Radar e Luís Paulo.

Vem a fase seguinte. Zico e Toninho seguem fora, lesionados na volta do Mundial. Nem mesmo o retorno de Cláudio Adão (recuperado de lesão) melhora o quadro, e o Flamengo afunda de vez em uma profunda crise após ser impiedosamente goleado em Porto Alegre (2-5 Grêmio), vexame que causa virulenta comoção no Rio de Janeiro e faz ferver a já complicada política interna do clube. O Flamengo ainda ensaia recuperação (0-0 São Paulo no Morumbi e 3-1 Coritiba), mas perde pela terceira vez para o América (0-1) e se despede melancolicamente com mais um vexame, uma derrota (0-1) para o Noroeste de Bauru. Dessa vez, o Flamengo termina o Brasileiro em 16º lugar.

Antes do início do Estadual, a pressão por dispensas e contratações vultosas vai ao limite. O tal lema “Flamengo protagonista” vira sinônimo de chacota e risos. A percepção geral é de que há alguns bons jogadores, mas o time é fraco e sem peso, um amontoado de promessas e jogadores bichados que não conseguem ajudar Zico e Júnior a formar uma espinha dorsal consistente e que sirva de apoio à subida dos novos talentos. As apostas em Carpegiani e Cláudio Adão já são consideradas fracassadas. “Foi um erro grosseiro a contratação desses dois jogadores”, comenta-se abertamente nos corredores da Gávea.

A resposta é a vinda de reforços. Mas reforços baratos ou mesmo de graça, da mesma forma. O veterano goleiro Raul, ex-Cruzeiro, é convencido a seguir jogando e é contratado, tal como apostas como Marcinho e Eli Carlos, além dos zagueiros Nelson e Moisés.

É pouco, dizem os jornais, esbravejam os detratores, murmura a torcida.

Mas será esse o time.

Vai começar o Estadual. Talvez o mais importante da história do Flamengo.