sexta-feira, 14 de abril de 2023

Alfarrábios do Melo

Saudações flamengas a todos,

E chegou ao fim aquele que, pelo contexto, pela estrutura colocada à disposição, pelo nível dos jogadores, pela remuneração polpuda e pela incapacidade de cumprimento de algumas metas de baixa complexidade, pode ser considerado o pior trabalho de um treinador sob a gestão Rodolfo Landim, e talvez a pior passagem desde que Ney Franco saiu do Ninho do Urubu pela porta dos fundos, incapaz de vencer um mísero jogo dentre os sete que disputou, no já longínquo 2014.

E, como as divindades da bola sempre costumam deixar mensagens expressivas para a posteridade, o epitáfio do lastimável Vitor Pereira foi escrito em negrito e letras garrafais, na vexatória goleada que fez o Flamengo, pela primeira vez em sua história, sofrer a reversão de uma vantagem de dois gols em uma Final de Estadual. Vexame que se somou a outros que engordaram o currículo do entediado treinador luso, tais como a eliminação para um time do possante futebol saudita no Mundial, a perda de um título internacional em um Maracanã lotado para uma equipe equatoriana de porte médio e, mais recentemente, a derrota na estreia da Libertadores para uma espécie de “Sampaio Correa” do Equador, que ostentava em suas fileiras um senhor de idade e um atacante cujo estado atlético (ou a sua falta) poderia ser comparável ao do nosso Vice-Presidente de Futebol.

Voltamos ao tempo em que colecionávamos vexames e chacota. Qual seria o limite? A briga para não cair no Brasileiro?

Entretanto, enveredar pelo cômodo caminho de espancar o medíocre, preguiçoso, tosco, apático e burocrático trabalho de Vitor Pereira e seu jogo posicional de totó seria apor antolhos que fariam impedir o esquadrinhamento de outros aspectos que tornaram “viável” a apresentação desta coisa absolutamente indizível e incompatível com a história antiga e recente do CR Flamengo.

Porque nem nos “anos de chumbo”, lá nos idos dos 2000s, viu-se um amontoado tão pouco identificado com as cores negras e rubras do nosso pavilhão.

A coisa começa com a imoral, obscena e ofensiva extensão do período de férias graciosamente concedido ao elenco, como “prêmio” pelo esforço de ter desenvolvido, ao longo de TODA a temporada de 2022, coisa de três ou quatro meses de futebol de alta performance, sob o “comando” do estimado Dorival Júnior. Pois. Por conta de três meses de bola, o plantel ganhou quase dois meses de férias, aí não contando o recesso autoimposto nos dias que se seguiram à conquista da Libertadores, quando o clube caminhou em campo no epílogo do Brasileiro, deixando-se abater por equipes já rebaixadas à Série B.

“Falta comando, falta pulso a esta administração banana, que deixa o poste urinar no cachorro.”

Não contente em “sabotar” e inviabilizar a realização de uma adequada preparação física na pré-temporada, por absoluta falta de tempo, a Diretoria ainda se dedicou a depredar a estrutura de uma equipe que, a despeito de seu funcionamento pouco sofisticado, possuía algumas peças-chave. Oras, sabe-se que um onze titular onde despontam nomes como Filipe Luís, David Luiz, Everton Ribeiro e Arrascaeta, além de um atacante “de ofício” como Pedro, não reúne e jamais vai reunir como principal atributo a intensidade e o vigor físico num sentido coletivo. E o que fazem os iluminados “generais e tubarões” que comandam o Flamengo? Desfazem-se justamente dos dois jogadores que mais ofereciam frescor e solidez ao esquema, no caso João Gomes e Rodinei. Pode-se até argumentar que o simpático lateral-direito, um tanto avançado em anos,  foi embora no momento certo e já possuía a reposição no elenco, quando o Flamengo trouxe o uruguaio Varela mesmo sem conhecer o jogador, como fora admitido pelo próprio clube (Será que scout, a exemplo de psicólogo, também é “coisa de v...”, como gosta de arrotar gente da Diretoria?), mas o que dizer de João Gomes? A principal peça de sustentação de um sistema defensivo já não muito sólido, vendido sem a mais precária e remota perspectiva de reposição? (se algum iluminado imaginou que o Gerson seria essa reposição, estamos em um buraco maior que o que parece).

Não contente em destruir o pouco que fazia o sistema defensivo e a própria dinâmica do time funcionar, a Diretoria aparece com uma estabanada troca de treinadores, seduzida novamente pela griffe. Sempre a griffe que embota o olhar do novo-rico, que precisa da aceitação imposta pela logomarca estampada na camiseta ou na grade frontal do veículo. E pediram licença a Dorival, não pelos erros que cometeu. Não pela incapacidade de “domar” o elenco. Não pelo esquema tático rudimentar que já dava sinais de colapso. Não pelo salário que supostamente teria pedido na renovação. Não pela suposta ambiguidade ao lidar com uma suposta possibilidade de supostamente dirigir a Seleção Brasileira (tudo sempre muito suposto). Dorival foi ejetado porque não tinha a griffe.

E chegou Vítor Pereira.

Português, de bom currículo, inclusive tendo derrotado o “SemiDeus” Jorge Jesus num desses Campeonatos Portugueses, capaz de impor um “nó tático” no segundo jogo da Final da Copa do Brasil ao Flamengo de Dorival (cuja atuação melhor no 0-0 de Itaquera ficou esquecida), a ponto de quase tirar do rubro-negro o Tetra da competição, Vítor Pereira chegou como o estrangeiro da vez, o homem capaz de fazer o Flamengo campeão mundial, continental, da coisa toda.

Um treinador adepto do jogo posicional de totó, de um futebol predominantemente físico, intenso e de escapadas em velocidade. Não necessariamente reativo, embora flertando com esse aspecto, mas incapaz de prescindir do vigor e do frescor de seus atletas.

Analisando com calma agora, mesmo sob o risco do chavão da inspeção de obra pronta, tinha como dar certo?

Em tempo: não que se esteja aqui a demonizar o tal jogo de posição que, como toda filosofia, requer condições adequadas para sua implementação e que, se bem executada, tende a produzir desempenho e resultados de alto nível. A questão reside na aparente certeza de que os aspectos nos quais se funda o tal jogo posicional são de encaixe extremamente difícil a um elenco que se acostumou a praticar um futebol móvel, caótico, associativo (de toques curtos, quase como um “toco y me voy”) e a se defender em blocos. Querer de volantes pesados como Willian Arão (quando atuava no Flamengo) ou Thiago Maia, ou lentos, como Gérson, que exerçam “perseguições” e grandes deslocamentos para cobrir amplos espaços é flertar com a perspectiva do desastre, por exemplo.

E daí se chega a mais uma questão. Se realmente a Diretoria do Flamengo parece crer que treinadores posicionais são os mais adequados para treinar a equipe (talvez seduzidos pelo complexo argumento de que se trata do “jogo ofensivo do Guardiola”), como demonstra a sistemática insistência por profissionais desse perfil (sem nunca negligenciar o fator “griffe”), beira o inacreditável que o clube não faça nenhum movimento consistente no sentido de promover a reformulação de seu elenco, com peças adaptáveis à sofisticada filosofia tática, que se pretende empurrar “goela abaixo” do plantel.

Em que pese a indigência tática e anímica do finado trabalho de Vitor Pereira, como justificar a absoluta falta de opções de jogadores para atuar aberto pelo lado direito do campo, além do caro e caótico Marinho? Ou a evidente carência do plantel de volantes da equipe, formado por Thiago Maia (o único de características defensivas típicas), pelo veterano Vidal, pelo já citado Gerson e pelo instável e limitado Erick Pulgar, que vive lesionado, além dos jovens Igor Jesus e Éverton, aquele de futebol rudimentar, este último nem isso?

Com efeito, desde que Jorge Jesus, que exercia uma espécie de controle no futebol que remetia a Telê Santana, resolveu “dar uma volta” no Flamengo e se mandar de volta para Portugal, a sistemática de contratação de reforços tem sido pautada por critérios enfaticamente questionáveis no que diz respeito à qualidade e à quantidade de nomes. Com a exceção de Éverton Cebolinha e David Luiz, que, “coincidentemente” são agenciados por um empresário que se tornou parceiro recorrente de negócios flamengos, e da “oportunidade de mercado” que fez o clube pinçar Varela, Pablo e Ayrton Lucas das terras em guerra, a tônica tem sido a vinda de jogadores medianos, vindos de longa inatividade ou apenas simplesmente de nível inferior. Impossível não cotejar a esquecível passagem de Kenedy com a do contestado Geuvânio, ou ver em Bruno Viana aspectos do futebol do pavoroso César Martins. Retrocesso.

“Jogadores jovens, baratos e com bom potencial de revenda. Não vemos como fugir desse perfil.”

Costuma-se dizer que no Brasil o ano começa “após o Carnaval”. Clichês à parte, parece que o ano do Flamengo também só se inicia após a chegada do treinador do segundo semestre, como aliás insinuou o (cada vez mais) boquirroto Filipe Luís após o vexame Aucas. De qualquer forma, antes disso é necessário aguardar o desfecho de mais uma temporada da Série “Esperando Jesus”, que todo ano exibe novos capítulos em alguma rede social perto de você. Afinal de contas, tem eleição chegando e imagem é tudo.

Encerro essas mal-humoradas linhas apreensivo com as perspectivas, a médio prazo, de um trabalho que, desde que o Gajo Jesus (o ÚNICO fator que se mostrou capaz de prover rendimento e performance compatíveis com o que o Flamengo arrecada e isso APESAR, e não POR CAUSA desta Diretoria cúpida e amadora) retornou ao seu hemisfério de origem, um trabalho que se funda quase exclusivamente na qualidade técnica dos jogadores contratados em 2019/2020, jogadores esses que já apresentam, em boa parte, certa tendência de declínio técnico e/ou físico, cuja necessidade de reposição tem sido irresponsavelmente ignorada por uma gestão financeira que, desde que se passou a se apresentar sob o comando do atual titular, tem sido marcada pela ênfase ao corte obtuso e inconsequente de gastos, entendendo desnecessário e supérfluo qualquer investimento que promova algum diferencial competitivo ou mesmo a manutenção de uma estrutura que viabilize que o clube exerça, de forma consistente, o protagonismo hegemônico a que se propõe.

Quando o Arrascaeta se for, quem virá para seu lugar? O Rodriguinho?

Boa semana a todos.

(PS1 – também estou acompanhando atentamente o processo de contratação do novo treinador. Os nomes até aqui ventilados com mais força foram o óbvio Jorge Jesus, que a Diretoria quer fazer convencer que está tentando trazer, além de Tite, Jorge Sampaoli e até mesmo Cuca. Um totalmente diferente do outro. Tudo griffe).

(PS2 - este texto foi escrito antes do vexame de Maringá. Porque o Flamengo de Landim, Braz e Tostes é assim. Os vexames já se tornam obsoletos com enorme velocidade. De qualquer forma, deve-se parabenizar esta Diretoria. DESTRUIR em SEIS MESES o melhor time da América do Sul é algo para poucos NO MUNDO.

(PS3 - se resolverem esperar 45 dias com essa "comissão técnica" e esses jogadores, o Flamengo estará diante de um risco real de rebaixamento à Série B. Que ninguém se iluda. Grêmio, Inter, Cruzeiro já mostraram o caminho. Estamos na mesma toada).