segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Discursos de Ódio


Salve, Buteco! Os últimos dias foram marcados pela deflagração de uma guerra após a invasão da Ucrânia pela Rússia do ditador Vladimir Putin. Rússia, esse país curioso e surreal, que saiu do czarismo para o comunismo, e deste para um monstrengo híbrido que busca resgatar a concentração de riquezas e poder do primeiro, mantendo a brutalidade e a opressão do segundo, dentro de uma roupagem pós-moderna, de ultra-direita e neoliberal. A tecnologia do Século XXI permite ao mundo todo acompanhar a população civil sofrendo com o bombardeio russo e execuções sumárias, pelo exército ucraniano, de quem desrespeita o toque de recolher. Partidos políticos e ideólogos de todos os lados se contorcem para adequar os fatos a velhas narrativas nas quais não se encaixa a crua realidade atual. Reinam as trevas e a desinformação.

O tempo de escuridão produz seus reflexos no futebol. Se eu não estiver me esquecendo de nenhuma ocorrência, de sexta-feira para cá houve explosão de bomba no ônibus que transportava jogadores do Bahia, atacado pela própria torcida; pedradas de torcedores do anfitrião Internacional sobre o ônibus do Grêmio, e ataques da torcida do Maringá sobre o visitante Cascavel, além da invasão de campo por torcedores que queriam agredir jogadores do Paraná Clube, derrotado por 1x3 pelo União e rebaixado para a Série B Estadual.

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O ódio que vemos em agressões, em estádios ou nas redes sociais, deságua nas manifestações de torcedores, mas começa por quem planeja e vive do futebol profissional, nas direções de clubes e redações de jornais e emissoras de televisão. A rivalidade destrutiva é semeada, quando não por textos ou declarações explícitas, em tuites e análises perversas, movidas por interesses corporativos e econômicos, ou ainda pela pura descompensação emocional, fruto podre da frustração com o time do coração.

O anti-flamenguismo é, no plano esportivo, a síntese do ódio atual. O mito do ente maligno transborda as críticas justas, escondendo corrupção, fraude, engodo e opressão de quem acusa o imperialismo, mas é tão ou mais agressor. Na era da pós-verdade, é fácil recortar frações de acontecimentos e criar narrativas que criam um grande inimigo, mas protegem na sombras do relativismo todas as espécies de manifestações do mal.

O jornalista que semeia (ainda que sutilmente) o ódio entre torcidas tem a alma manchada com o sangue e o sofrimento de cada vítima da violência, física, verbal ou virtual.


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Desde que eu acompanho futebol, o meu parâmetro de elenco é o do AC Milan de 1991-1995 e 2006-2007. O time-base do primeiro período, ilustrado pela foto que inicia o post de hoje, era Rossi; Maldini, Baresi, Costacurta (Galli) e Tassotti (Panucci); Albertini (Rijkaard), Donadoni (Evani; Desailly), Gullit (Simone) e Boban (Eranio); Van Basten (Savicevic/Papin) e Massaro. Técnico: Fabio Capello.

O time de 2006-2007 tinha Dida; Cafu (Oddo), Nesta (Costacurta), Maldini (Kaladze) e Jankulovski (Favalli); Gattuso (Gennaro), Pirlo (Ambrosini), Seedorf (Serginho);  Kaká (Gilardino/Gourcuff) e Ronaldo (Ricardo Oliveira/Inzaghi). Técnico: Carlo Ancelotti.

O AC Milan desses dois períodos, para mim, é o melhor exemplo de excelência na gestão de futebol - preparação física e tática, competitividade, gestão e rodagem de elenco, tudo resultando em resultados com uma fantástica qualidade de futebol. Meu sonho sempre foi o Flamengo conseguir, mediante uma gestão administrativa e financeira estável, alcançar como regra esse padrão de excelência.

Para quem quiser se aprofundar nesses períodos do gigante rubro-negro italiano, recomendo os textos dos sites Calciopédia (1) e Imortais do Futebol (2 e 3).

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No Bilhete a Mister Paulo, publicado há duas semanas, já descrevi o bastante sobre o fenômeno da não aceitação do Flamengo por seus rivais e seus jornalistas-torcedores de estimação. Desnecessárias maiores digressões. Só gostaria de frisar que tenho orgulho de você, Flamengo. De sua História, de sua Torcida, de ser parte da Nação que formamos, e dos elencos que com muito trabalho e suor conseguimos montar (o atual carece de reforços).

Te amo e sempre estarei contigo, com o Manto Sagrado e a bandeira na mão.

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O time tem padrão de jogo, a construção é muito boa, mas os jogadores estão intranquilos ou não conseguem focar. Os passes finais, as decisões na hora de arrematar são as piores possíveis. Essas constatações, ao lado da "falha" de Diego Alves, talvez possam resumir o primeiro tempo do jogo de ontem.

No intervalo, Paulo Sousa foi mal nas substituições. João Gomes dava volume ao time e era o motor do meio campo, enquanto Andreas foi pouco a pouco sumindo do jogo. Léo Pereira também fazia boa partida e o time perdeu com a entrada de David Luiz. Arrascaeta foi o único que entrou bem, embora, a bem da verdade, o treinador não tivesse como adivinhar que Bruno Henrique cairia tanto de rendimento na segunda etapa. O certo é que teria sido melhor ficar com Pedro em campo. Contudo, apesar da queda geral de rendimento, o time voltou a criar chances de gol que poderiam ter virado o placar, mesmo com a segunda "falha" de Diego Alves, o qual provou que não tem mais condições de continuar a jogar pelo Flamengo. 

Como já vinha dizendo desde o final do ano passado, 2022 será o ano das estrelas provarem que ainda têm gana para conquistar mais títulos pelo Flamengo. Nesse ínterim, o treinador terá que encontrar uma solução para esse problema ou será por ele consumido. Como Mister Paulo sempre faz questão de lembrar, o esquema é baseado na "eficácia". Tudo o que vem faltando ao time nas duas últimas temporadas, convenhamos. Até por isso talvez o treinador não devesse ser tão rigoroso com o Marinho, por exemplo.

Mas Mister Paulo está longe de ser o problema e arrisco dizer que é o treinador que deu o melhor padrão de jogo ao time desde a saída de Jorge Jesus. 35 (trinta e cinco) finalizações mostram que o problema das chances desperdiçadas não é tático, é técnico. As falhas dos goleiros não vêm de hoje e os reforços que até as pedras sabem que são necessários não chegaram, muito pelas escolhas feitas pelo próprio clube sobre quem traz da Europa. A multa do Banco Central não pode servir de muleta.

A culpa do que está acontecendo, portanto, não é do treinador, porém não duvido que, como de costume, seja ele que venha a pagar o pato. Dirigente nenhum arrisca o próprio pescoço, e tenho sérias dúvidas de que esse elenco tenha brios para reconhecer a sua grande cota de responsabilidade. A tradição brasileira é sobrar para o distribuidor de coletes.

Abra os olhos, Mister Paulo.

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A palavra está com vocês.

Bom dia e SRN a tod@s.