segunda-feira, 7 de junho de 2021

Não se faz mais 7 de junho como antigamente

Salve,  Buteco! De repente, tudo parou mais uma vez, ao menos para nós, torcedores do Mais Querido. Com o encavalamento de competições nacionais e internacionais (de seleções), e com as seleções brasileira (principal e olímpica), uruguaia e chilena "depenando" o melhor elenco da América do Sul, alguns jogos do Mais Querido foram adiados. O vazio de certa forma reavivou a minha memória de tempos nos quais em junho não havia partidas oficiais quer pelos estaduais, quer pelo brasileiro. Não que fosse uma regra, mas até meados da década de 90, no mínimo em metade dos anos de cada década o Flamengo excursionava entre junho e agosto, seja no modo "Bye Bye Brasil" ou em turnês pela Europa, no final da primavera ou no auge do verão do Velho Continente. Então, num 7 de junho qualquer, o Flamengo tanto poderia estar amistosamente em Teresina (3x1 River/1959 e 1x1 Tiradentes/1972) ou em Curitiba (1x0 Coritiba/1961), como em Eyravallen/Suécia (6x2 Orebro SK/1962) ou em Liebenauer/Áustria (2x1 Sturm Graz/1963). 

Mas como deixei claro, não era em todo mês de junho que havia espaço para essas excursões. Se já existisse Internet, Buteco do Flamengo e FlaTT, em 7 de junho de 1942 estaríamos num "dia de inferno" após a derrota para o Fluminense por 1x2 em São Januário, a ponto de ser chamado de louco incurável quem dissesse que acreditava numa reviravolta e arrancada para o primeiro tricampeonato. Em 7 de junho de 1978 estaríamos descartando qualquer sinal positivo na vitória sobre o Botafogo de Ribeirão Preto por 2x0 no Maracanã, esculhambando a iminente eliminação naquela edição do Campeonato Brasileiro e a falta de títulos daquela geração. 

No ano seguinte, apesar do êxtase pelo título carioca conquistado com o cabeceio do Rondinelli em novembro, muitos ainda estariam desconfiados daquele time que, em 7 de junho, venceu o Bangu por 3x1. Afinal, era uma simples Taça Guanabara... "Quero ver conquistar o título brasileiro", certamente muitos butequeiros diriam. E mesmo com ele, o título brasileiro, chegando em 1980, em 7 de junho de 1981, após a perda do tetra estadual no segundo semestre do ano anterior e da eliminação para o Botafogo no Brasileiro, a vitória sobre o Vasco pela Taça Guanabara (1x0, gol de Zico) provavelmente seria recebida com desconfiança, não faltando butequeiros que o chamassem de decadente: "esse Adílio não marca ninguém! Lico?! Joinville!? Isso não é jogador pro Flamengo!"

Porém, como havia dito, os anos das excursões no meio da temporada me parecem ser mais numerosos, e acho que muitas vezes os 7 de junho teriam sido marcados pelo otimismo. Por exemplo, em 1956, os 12x1 sobre o Brann da Noruega, na cidade de mesmo nome, certamente seriam indício claro do tetracampeonato. "Torneio Início não vale nada! O tetra é obrigação!" (É fácil imaginar quem escreveria isso, rs). A mesma expectativa provavelmente ocorreria em 7 de junho de 1980, nos 3x1 sobre o Eintracht Frankurt, no Waldstadion, em plena comemoração do primeiro título brasileiro, conquistado exatamente uma semana antes. Quem poderia imaginar uma derrota para o Serrano, em Petrópolis, com gol do Anapolina? 

Já em 1988, após a vitória por 1x0 sobre o Bayer Leverkusen e o título da Copa Kirin naquele 7 de junho, estaríamos debatendo a respeito das chances de bicampeonato no Brasileiro que estava por começar. Uns mais otimistas e acreditando numa arrancada, outros já enxergando (corretamente) o declínio. Aliás, naquela oportunidade, a rigor, nem havia esse espaço no calendário. Escrevendo esse texto, lembrei-me do João Saldanha, na Rede Manchete, bradando irônica e profeticamente: "o Flamengo é campeão da Copa Kirin, hein? Cuidado com o campeão da Copa Kirin!"

O canto do cisne das excursões no meio das temporadas brasileiras ocorreu em 1994, ano no qual houve excursão de junho a agosto. Em 7 de junho o Flamengo venceu amistosamente o Avaí por 2x0 e, no mês seguinte, sagrou-se campeão do Torneio de Kuala Lumpur, na Malásia, com direito a vitórias sobre o Leeds United (1x0) e Bayern de Munique (3x1), sempre com show de Sávio. O Buteco teria vindo abaixo, com unânimes exigências de convocação. Logo em seguida, dois empates com o Celtic Glasgow (1x1 em Dublin e 2x2 em Glasgow), um no final de julho e outro no início de agosto, encerraram, para o Mais Querido, a nostálgica era das excursões. Sem imaginar do simbolismo desses dois jogos, não faltariam butequeiros pesquisando minuciosamente o desempenho dos escoceses para, desconfiadamente, medir o "tamanho" dos empates.

É que, com o Brasil tetracampeão do mundo, o calendário nacional passou a ser preenchido por competições oficiais promovidas por FFERJ, CBF ou CONMEBOL, e a partir de então as excursões de meio de ano passaram a integrar um nostálgico capítulo da História do Mais Querido e do futebol brasileiro.

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Em 1919 o Flamengo não jogou no dia 7 de junho, mas estreou no Campeonato Estadual no dia seguinte, vencendo por 6x2 o Botafogo. Se existissem a Internet, a FlaTT e o Buteco do Flamengo, talvez estivéssemos felizes tanto com a estreia, como com o primeiro grande título da Seleção Brasileira, conquistado no dia 31 de maio com uma vitória por 3x1 sobre o Uruguai, no Estádio das Laranjeiras, na terceira partida (desempate) da final do Campeonato Sul-Americano, a Copa América daquela época.

Naqueles tempos, a Seleção Brasileira morava nos corações dos torcedores e nossa felicidade viria não apenas da conquista inédita, mas também do alívio pelo bom senso das autoridades, que no ano anterior adiaram a competição com o objetivo de conter o avanço da "Gripe Espanhola", como conta essa interessantíssima matéria do Estado de S. Paulo, a qual resgata matérias de edições do próprio jornal, publicadas na época.

Este 7 de junho, então, em termos futebolísticos, é quase como os dos velhos tempos das excursões. Quase porque o Flamengo não jogou hoje, nem ontem e nem no final de semana, já que há um campeonato em curso, mas que na prática não está em curso, ao menos para o Mais Querido. Nos velhos tempos ao menos sabíamos mais ou menos o que iria acontecer na semana seguinte, inclusive em nível de escalação.

Este 7 de junho também não é como os outros porque as autoridades, públicas e desportivas, já deram mais valor à vida neste país e neste continente. Aliás, a referência à falta de jogos do Flamengo, antes que me perguntem, é apenas um desabafo bem-humorado de um torcedor em plena crise de abstinência. Neste outro caso, o desabafo é de tristeza e indignação mesmo.

Já não se faz mais 7 de junho como antigamente.

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Como sempre, a palavra está com vocês.

Bom dia e SRN a tod@s.

* Em 1995, o Flamengo ainda excursionou em agosto, disputando amistosos na China, Hong Kong e Japão, além do Troféu Teresa Herrera, na Espanha.