segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Sobre o Treinador para 2016

Salve, Buteco! A interrupção do Campeonato Brasileiro para as duas rodadas das Eliminatórias para a Copa do Mundo permitiram o texto abordando uma questão importante relacionada com o Departamento de Futebol: o treinador. Desde a gestão Patrícia Amorim, que antecedeu a atual, o Flamengo, vez por outra, tem recorrido a um modelo esquisito, delegando o setor a um treinador centralizador (em ambos os casos Vanderlei Luxemburgo), sem que tais atribuições lhe sejam oficialmente designadas, o que na prática gera atritos, como por exemplo o noticiado pela imprensa entre o ex-chefe do Departamento Médico, José Luiz Runco, e o próprio Luxemburgo, e cria situações esdrúxulas, como um diretor executivo com menos poder em sua gama de atribuições do que o próprio treinador centralizador, como ocorreu com Rodrigo Caetano no início do ano, fato agravado pela indefinição dos temas a respeito dos quais o Conselho Gestor do Departamento de Futebol deveria atuar (ao menos até o meio do ano).

Em vários textos tenho destacado que a falta de coesão e coordenação do Departamento de Futebol tem interferido diretamente no trabalho tanto do treinador como dos atletas. Como uma miríade de causas e consequências que torna praticamente impossível identificar onde estão o início e o fim dos problemas, como em um círculo vicioso, o planejamento é feito no início do ano para ser refeito quando se inicia o Campeonato Brasileiro, mas quem elabora o planejamento não o executa porque já foi demitido. Nesse ínterim, os atletas que foram indicados por um treinador não são utilizados pelo que o sucede (já que a média de permanência é quadrimestral) ou mesmo porque, em alguns casos (talvez não poucos), simplesmente não são qualificados para disputarem uma Série A com a camisa do Flamengo, fora as contusões e recuperações estranhamente lentas, que prejudicam o trabalho de montagem do esquema tático padrão e as necessárias variações.

Em meio a esse caos, com média quadrimestral de troca, treinadores com as mais diversas características são contratados, desde os medalhões adeptos a mais volantes e menos treinos táticos (a hoje "velha guarda" dos treinadores brasileiros), como também alguns nomes da nova geração, perdidos entre a necessidade de inovar taticamente (reproduzindo modelos europeus) e a esmagadora pressão de dirigir o clube de maior torcida no mundo, passando também pelos "ex-atletas identificados com o clube", uma espécie do gênero treinador (há quem discorde que alguns até que sejam autênticos treinadores) peculiar ao Flamengo, que só dão certo no Flamengo. As passagens desses treinadores, em geral de curta ou média duração, quando dão certo, geram times arrasadores e levam a conquistas gigantes e inesquecíveis. Porém, esse tipo de fenômeno tem sido cada vez mais raro e efêmero. Apesar disso, de vez em quando nossos dirigentes recorrem novamente essa velha fórmula, e há quem defenda a volta da sua utilização.

O ponto é que, nesse verdadeiro "rodízio" de treinadores, a escolha jamais se pautou por um perfil que se adaptasse a uma filosofia de trabalho a longo prazo no Departamento de Futebol, a uma identidade que se queira dar ao futebol do clube. Ao contrário, o que faltou foi sempre critério e as escolhas ocorreram invariavelmente para apagar incêndios e conter a crise do momento, recaindo sobre o nome disponível no mercado, ainda que algumas vezes tenha sido um nome de peso, dadas as circunstâncias.

Não surpreende que o Flamengo tenha se transformado em uma verdadeira máquina trituradora de treinadores, sendo os bons momentos exceção à regra da crise. Da mesma forma, não deveria surpreender que, no meio do caos, inexista autoridade e o problema da indisciplina e do mau comportamento fora de campo seja recorrente a cada geração de atletas. Onde inexiste sistema, ordem e coesão não se pode esperar produção de qualidade e com estabilidade. Ontem tivemos mais um exemplo de falta de compromisso e autoridade: não bastasse o pífio futebol apresentado contra um adversário absolutamente desqualificado no dia do aniversário de 120 (cento e vinte) anos do clube, os jogadores que disputaram o primeiro tempo simplesmente foram embora do estádio no intervalo. Teriam sido autorizados?

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Venho batendo sempre nessa tecla de que o Departamento de Futebol do Flamengo é um ambiente corroído que gera efeitos nefastos dentro das quatro linhas e por isso precisa ser reestruturado. Contudo, não pensem que atribuo a esse fator a única causa da falta de títulos e qualidade do setor nas últimas décadas. Tenho para mim que, desde Cláudio Coutinho, o Flamengo só teve um treinador de ponta, na verdadeira acepção da palavra, o que, convenhamos, não é pouca coisa. E o que seria, no meu conceito, um "treinador de ponta" ? Não basta ter passagem pela Seleção Brasileira. É aquele treinador que realmente faz a diferença fora das quatro linhas, em todos os aspectos, desde o plano tático até o trato com o elenco. Na minha opinião, o último que o Flamengo teve nesse nível, depois de Cláudio Coutinho, foi Telê Santana. Nos últimos tempos da geração mais vitoriosa e no início da baderna que se instaurou no clube, a qual o movimento que levou a Diretoria atual ao poder tenta consertar, Telê Santana não foi prestigiado. Um ano depois, iniciou o trabalho que tod@s conhecemos no São Paulo Futebol Clube, que na época possuía dois títulos brasileiros, nenhuma Libertadores e nenhum mundial, contra quatro brasileiros, uma Libertadores e um Mundial do Flamengo. O resto é história.

Desde então até hoje, tivemos até bons treinadores ou treinadores com importantes currículos, nomes como Zagallo, Vanderlei Luxemburgo, Paulo Autuori, Jair Pereira, Oswaldo de Oliveira, Evaristo de Macedo e Mano Menezes. Os que não tiveram passagem pela Seleção Brasileira, ainda que Sub-20, conquistaram títulos em nível brasileiro, continental ou mundial, mas nenhum deles, na minha opinião, chegou ao nível técnico de Cláudio Coutinho e Telê Santana em suas carreiras, como tampouco, no Flamengo, deram certo como Carlinhos e Joel Santana ou como os efêmeros, porém arrasadores Andrade e Jayme de Almeida, ou ainda como Paulo César Carpegiani, em sua primeira passagem pelo clube. Dentre os que "deram certo", merece destaque o fato de que todos eles, à exceção de Joel, são da espécie "ex-jogadores identificados com o clube", e dentre eles apenas Paulo César Carpegiani, Carlinhos e Joel conseguiram desenvolver trabalhos um pouco mais longevos.

Como vocês podem observar, a escolha do "treinador ideal" para o Flamengo é atividade complexa e historicamente tendente e dar errado. Quando olho para esse quadro, lembro que, em 2016, alguém terá que tocar o barco, assumir a responsabilidade de tomar a decisão correta e, claro, ouvir todas as cornetas soarem impiedosamente altas e estridentes no momento seguinte ao anúncio. É melhor que, a partir de então, o futebol tenha passado a ser prioridade de fato no clube.

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A moda agora é a "reciclagem no futebol europeu". Bem, ao menos alguns dos nossos treinadores reconhecem que são completamente ultrapassados. Quem sabe não é um recomeço? A primeira pergunta que deve ser feita, nesse contexto, é, obviamente, em que consiste essa tal reciclagem? A segunda, se essa reciclagem for mais do que uma simples pantomima, quais treinadores efetivamente se reciclaram na Europa? A terceira, quem supostamente a fez com êxito, caso de Tite, treinador do Corinthians, ou Dorival Júnior, treinador do Santos, realmente pode atribuir a essa tal reciclagem sua franca evolução ou teria ela decorrido de sua própria capacidade de percepção, estudo e renovação?

Muricy Ramalho é o nome que pipoca na mídia e redes sociais como o de preferência do presidente Eduardo Bandeira de Melo (acaso reeleito) para 2016. Supostamente se reciclou no Barcelona. Como vocês, amig@s do Buteco, situariam Muricy dentro das três perguntas do parágrafo anterior?

E partindo do pressuposto que o Flamengo é capaz de conquistar os maiores títulos com um treinador que não seja da espécie "ex-treinador identificado com o clube", como também propiciar a um treinador "de ponta" condições para desenvolver um trabalho de longo prazo, ao contrário do que vem ocorrendo nas últimas três décadas, ainda pergunto a você, amig@ do Buteco, na condição de presidente do Flamengo: manteria Oswaldo de Oliveira, contrataria Muricy Ramalho ou tentaria outro nome? Nesse último caso, qual?

A propósito, não, não acho que o Oswaldo de Oliveira seja treinador para o Flamengo, mas a palavra não está mais comigo e sim com vocês.

Bom dia e SRN a tod@s.