sexta-feira, 23 de maio de 2014

Sobre ousadia e criatividade

Assistindo a tenebrosa atuação do Flamengo na quarta-feira, fiquei imaginando se o Ney Franco iria conseguir deixar o time ainda mais bagunçado do que estava com o Jayme. Inevitavelmente surge o argumento de que o técnico acabou de assumir o time e mal teve tempo de treinar, etc, etc, etc. Ainda assim, o recreativo de véspera de jogo foi noticiado em diversos portais. Será que faltou tempo mesmo para organizar o time?

Vejamos. O treinador espanhol que comanda o Bolívar, assumiu o time em um domingo à noite, após uma sequência de resultados ruins no campeonato local e na Libertadores. Na quarta-feira veio ao Rio enfrentar o Flamengo e mostrou um time bem armado, com jogadores bem posicionados e com proposta de jogo definida, que deu o resultado esperado. Em três dias, com uma viagem internacional no meio. É algo que parece ser impensável para 10 em cada 10 treinadores brasileiros, talvez com raríssimas exceções e em casos muito especiais.

Paradoxalmente, a imprensa esportiva raramente comenta sobre a baixíssima qualidade do trabalho feito pelos técnicos brasileiros e, ao invés de incentivar a busca pela reciclagem, vive incensando os mesmos "professores" de sempre, que oscilam entre os boleiros/churrasqueiros e o disciplinadores/verborrágicos, passando pelos estagiários/inventores. Talvez, o medo que os clubes têm de inovar no comando das equipes, encontre algum vestígio de justificativa pelo fracasso de experiências recentes, como a de Jorge Fossati no Internacional e Daniel Passarela no Corinthians. Rumores de sabotagem dos jogadores, avessos a treinamentos mais pesados e a cobranças mais sérias são freqüentes, além da sempre lembrada "dificuldade de adaptação" dos estrangeiros.

O livro soccernomics menciona a importância da troca entre diferentes escolas de jogo para crescimento da qualidade dos campeonatos locais e até das seleções, especialmente com a importação de treinadores de outros centros. É algo para se pensar, especialmente quando vemos um treinador italiano e um argentino levando dois times espanhóis à decisão da champions league. Vale lembrar também os outros dois semi-finalistas, um time inglês dirigido por um português e um alemão dirigido por um espanhol.

Olhando para o cenário nacional, não dá para imaginar a imensa maioria dos nossos cartolas tradicionais estudando o mercado e buscando inovar para crescer e evoluir. Uma mudança de paradigma deveria vir de gente nova, com idéias novas, como a turma que assumiu o Flamengo. A parada para a Copa seria uma oportunidade de ouro, com tempo para treinar e montar um time a partir do elenco montado que está na média dos times daqui. Infelizmente, não foi o que aconteceu.

A boa nova veio do Palmeiras, clube que tem uma situação política de evervescência semelhante à do Flamengo e que vem tentando seguir um caminho de austeridade e reestruturação também parecido com o nosso. Os palestrinos tiveram a ousadia que nos faltou no momento da demissão do Jayme e foram buscar um treinador estrangeiro, quebrando a quase reserva de mercado que existe no nosso país para os técnicos brasileiros.

Não há como prever se vai dar certo mas para um time que acabou de voltar da segunda divisão, talvez não haja muito a perder. Já no caso rubro-negro, segue a interminável dança das cadeiras com o quinto técnico em 17 meses. As notícias que saem nos portais dizem que o departamento de futebol será reformulado até a parada para a Copa. Será muito bom para o clube se essas mudanças tiverem a ousadia que fica evidente na reestruturação jurídica, financeira e administrativa do Flamengo, mas que fez tanta falta na hora da escolha do novo treinador.

abraços e SRN!