sexta-feira, 29 de março de 2013

A crítica consciente


Em tempos que ficaram no passado, qualquer pessoa que criticasse a diretoria do Flamengo tinha 99% de chances de ter razão, especialmente na gestão anterior, que levou a incompetência aos limites mais extremos. Mesmo quando acertavam na concepção erravam na execução e vice-versa. Mas as coisas estão diferentes na Gávea e agora as pessoas que estão lá parecem saber muito bem o que estão fazendo. Pelo menos fora de campo, não dá para criticar apenas por não gostar da decisão A ou B.

Gostaria de falar um pouco do Nação Rubro Negra, o programa de relacionamento que o Flamengo lançou na última terça-feira. Inicialmente, penso que é importante não confundi-lo com um programa de sócio torcedor, já que aqueles que aderirem, não podem ser considerados sócios nem ter direito a voto por questões estatutárias. Ocorre que mudar o estatuto do clube é um processo lento, complicado e o Flamengo, por conta de sua situação financeira, realmente não poderia se dar ao luxo de esperar por isso para lançar um programa de relacionamento com seu torcedor.

Assim como muita gente, fiquei bastante decepcionado com o programa e com a forma como ele foi apresentado ao público. O marketing tem basicamente a função de gerar receita para o clube potencializando suas vendas e os números até agora indicam que o objetivo vem sendo atingido. Mas isso realmente não era uma tarefa das mais difíceis dada a enorme demanda reprimida e a esperança depositada pelos torcedores na nova diretoria. É como a futura camisa da adidas, mesmo que o modelo seja caro e não seja dos mais bonitos, certamente vai ser um sucesso de vendas por causa da lembrança afetiva da marca e da associação com os tempos mais vitoriosos do Mengão.

Tenho críticas principalmente à concepção do projeto e ao que ele não entrega ao torcedor. Não estou falando de benefícios de ingressos, camisas ou produtos do clube – coisas óbvias -  mas sim a sensação de orgulho de fazer parte do Flamengo, da Nação. Assim como ficou demonstrado no aumento dos preços dos ingressos e dos títulos de sócio do clube, mais uma vez o Flamengo não mostra nenhum interesse em trazer seus torcedores para perto do clube e do time, mas sim em conseguir arrecadar o máximo de dinheiro que puder de cada um.

No programa NRN apenas pede-se que o torcedor ajude o clube, em troca de serviços que já estavam disponíveis em outros lugares, como compra pela internet ou usar o cartão como ingresso na roleta do estádio. Além disso, faz uso de uma rede de benefícios criada – sem nenhuma participação do marketing rubro-negro - para os torcedores de todos os times.

As decepções costumam ser proporcionais as expectativas criadas por cada um, mas por tudo que foi falado sobre marketing durante a campanha eleitoral do Flamengo, eu esperava algo realmente genial, que unisse conceitos e tendências avançadas de programas de relacionamento de todo o mundo. Fiquei incrédulo ao ver erros primários como vazamento do site antes da hora ou a impossibilidade de rubro-negros de fora do Brasil se cadastrarem no programa.

É claro que o Nação Rubro-Negra não é um programa fechado e pode – e deve – evoluir bastante ainda. A equipe de marketing traçou uma estratégia e parece ter como meta colocar sempre o lado econômico em primeiro lugar, garantindo receitas e minimizando riscos e prejuízos. Ainda que eu compreenda a situação calamitosa das finanças do clube, lamento muito que as ações de marketing do Flamengo estejam voltadas apenas para resolver as questões financeiras da instituição. Aqui não é uma crítica ao departamento mas apenas uma reflexão. Sempre entendi o Flamengo como uma manifestação cultural de massa que nasceu a partir de um time de futebol de um clube do Rio de Janeiro.

O torcedor, massacrado nos últimos anos pelas vergonhas sucessivas dentro e fora de campo é o ativo mais importante do clube. Não só o que pode pagar 40 ou 200 reais apenas para ajudar mas principalmente aqueles que guardam o seu dinheirinho suado para comprar um ingresso e assistir aos jogos. Aquele que mora longe do Rio de Janeiro e passou do rádio à televisão e à internet para acompanhar de longe a sua paixão. O que faz do Flamengo um dos maiores clubes do mundo é justamente esse caráter universal. Ninguém é mais Flamengo que ninguém e creio que o clube deveria considerar isso em suas ações. Talvez, antes de planejar excursões à Europa nas pré-temporadas, o clube devesse fazer uma ou duas delas no Norte e Nordeste do Brasil, reforçando sua presença de marca e contendo o avanço dos clubes paulistas naquelas regiões. Mas como mencionado antes, são apenas reflexões.

É verdade que o Clube de Regatas do Flamengo é um grande negócio que movimenta milhões de reais e com enorme potencial de lucro mas é também o objeto de paixão de muita gente. Não são poucas as histórias de rubro-negros em todo o mundo que fizeram sacrifícios gigantescos para ver o Flamengo e seus ídolos nem que estão dispostas a tirar dinheiro de onde não tem para ajudar esse objeto de amor. Ver o Flamengo deliberadamente explorar a paixão dessas pessoas sem ter nenhuma intenção de dar nada em troca me parece ir contra aquilo que o clube sempre representou, especialmente quando se contrapunha a seus aristocráticos rivais.

Para encerrar essa semana, quero parabenizar o trabalho dedicado e magistralmente executado pela diretoria no pagamento e na renegociação das dívidas que sufocam o clube. A seriedade demonstrada pelo presidente Bandeira de Melo e sua equipe permitiu que o clube passasse de falido e desacreditado a detentor de quase todas as certidões que o credenciam como bom pagador em menos de dois meses. Certamente um recorde! Agora falta muito pouco para o clube poder buscar patrocínios e incentivos fiscais que desafoguem os esportes olímpicos e até mesmo o futebol. Boa Presidente!!


abraços a todos e SRN!

Ah e antes que eu me esqueça: ão, ão ão, nós temos certidão!!!